Teve a coragem inaudita - de dizer muitas coisas que
os outros não tinham de dizer. Isto foi a grandeza de Einstein. Ter a coragem
de professar verdades que a sua consciência lhe dizia.
* * *
TRANSCRIÇÃO DA AULA 13 - Livre arbítrio e evolução
Curso 1978
Aula 13: Livre arbítrio e evolução
Vamos
começar. Espero que não me deixem monologar. Que façam um pouco de diálogo
porque não quero falar sozinho. De vez em quando vocês devem fazer perguntas
porque senão vira monólogo e as aulas devem ser dialogadas. Então vocês devem
dar os seus pareceres, fazer perguntas para eu poder completar. Vou começar assim:
Vocês
sabem que estamos aqui no ocidente chamado cristão. Toda Europa e as Américas
são chamadas “O Cristianismo”. O cristianismo abrange mais ou menos um terço da
humanidade. Em toda a teologia de todo o cristianismo seja além ou aquém do
Atlântico, não interessa, há só duas palavras importantes. E nós temos que
tomar uma atitude filosófica em face destas duas palavras que são muito
teológicas. Porque a teologia se dirige pela Bíblia, pelo Evangelho, pelas
coisas feitas pelos homens ou inspiradas. Mas, nós na filosofia não podemos
basear em nenhum livro. Devemos basear exclusivamente na razão.
Então, eu
quero propor essas duas palavras que funcionam há dois mil anos em todas as
teologias cristãs de qualquer igreja. Chama-se: pecado e redenção.
Pecado e redenção do homem. O que é que nós devemos pensar quando lemos que o
homem é pecador e deve ser remido? Que é que nós podemos pensar filosoficamente
sem entrar em nenhuma teologia. Quer dizer, a idéia de pecado e redenção tem
por base o livre arbítrio, porque se não há livre arbítrio, não há tal coisa
como pecado. O animal não tem pecado, a pedra não tem pecado, a planta não tem
pecado. O animal não pode ser remido, a planta não pode ser remida.
Quer dizer, essas duas palavras
- pecado e redenção - supõem o livre arbítrio... - que o homem possa fazer o
mal e que ele possa também fazer o bem. O mal é negativo e o bem é positivo.
Isso está por detrás destas duas palavras. O que é que nós devemos pensar
filosoficamente sobre pecado e filosoficamente sobre redenção do pecado?...
Uma grande seita japonesa,
muito conhecida aqui no Brasil afirma categoricamente de alto a baixo que não
há tal coisa como pecado. E se a gente fala a eles em pecado eles falam. ‘Isto
é bobagem, não tem pecado’. Isso é uma grande orientação no Japão, muito
conhecida aqui no Brasil. Vocês conhecem todos. E ainda agora eu li no próprio
Taniguchi que é o autor de tudo isto (eu tenho muitos livros do Taniguchi)... -
tem um capítulo inteiro provando que não existe tal coisa como pecado na
humanidade. Tudo isto é imaginação. Tudo é bom, nada é mau.
Quer dizer que nega o livre
arbítrio, é claro. Se nós negamos o livre arbítrio reduzimos o homem ao animal
porque o animal não tem livre arbítrio. Se quisermos manter uma diferença
essencial entre a natureza inferior (mineral, vegetal e animal) e a humanidade
temos que aceitar a idéia do livre arbítrio. Porque a única diferença entre nós
e a natureza é o livre arbítrio. A natureza não tem responsabilidade. A
natureza não é responsável por nada que faz, porque ela tem que fazer isto
automaticamente. Ela não faz livremente nada. Ninguém. Nenhum ente da natureza,
nem pedra, nem vegetal, nem animal faz.
Se nós não podemos fazer nada
livremente como diz Taniguchi e outros, então nós não temos nenhuma diferença
do resto da natureza. Mas, todo mundo acha que nós somos essencialmente
diferentes. Que nós podemos fazer-nos melhores do que somos e podemos fazer-nos
também piores do que somos. Isto é convicção universal da humanidade. E não é
só do cristianismo. No paganismo também. A filosofia da Índia, da China e do
Japão também aceita o livre arbítrio.
Quer dizer, não podemos desistir
desta idéia de que haja no homem algo pelo que ele se possa fazer maior do que
é, ou menor do que é. Aquele pensador moderno que nos deu essas palavras
maravilhosas: “Deus creou o homem o menos possível para que o homem se possa
crear o mais possível”, (de um pensador europeu) – é uma afirmação do livre
arbítrio.
É claro, se Deus fez o homem o menos
possível, apenas potencialmente humano, para que o homem se possa fazer
atualmente, perfeitamente humano, então isto é uma afirmação do livre arbítrio.
Então vamos antes de tudo afirmar: “Nós temos uma faculdade pela qual nós
podemos ser moralmente maus e moralmente bons”. Estou falando no terreno
moral. Fisicamente, tudo que foi feito é bom. Mas moralmente, não. Fisicamente
é uma linha só. A creação é isto.
Isto não é moralmente bom nem
moralmente mau. Isto é fisicamente bom. Aliás, neutro. É melhor dizer neutro
para não confundir. Vamos por o sinal neutro aqui. Isto não é nem positivo, nem
negativo, isto é neutro (travessão). Aqui começa a humanidade. Temos que fazer
duas linhas, uma linha bifurcada. Até aqui não há linha bifurcada. Aqui não há
nada de moralmente bom nem moralmente mau. Aqui na natureza. Tudo é neutro.
Moralmente falando tudo aqui é neutro. Aqui começa a diferença. Aqui temos que
pôr um positivo e um negativo, quando começa a humanidade. Quer dizer aqui
podemos dizer, moralmente bons e moralmente maus. Aí está o livre arbítrio.
Aqui entre os dois está a antítese do livre arbítrio. Porque se não há livre arbítrio
ninguém é bom e ninguém é mau.
E dizer que alguém possa ser
mau e alguém possa ser bom é pura fantasia se não há livre arbítrio. Suponhamos
o seguinte: na última guerra foram mortos mais de seis milhões de pessoas
inocentes que não tomavam parte na guerra. Não eram soldados, eram famílias que
foram bombardeadas e mortas nos campos de concentração. Isso era bom ou mau.
Nós entendemos que quem foi responsável por seis milhões de mortes de inocentes
não praticou uma coisa moralmente boa. Praticou uma coisa moralmente má. E cada
um de nós tem a impressão que ele pode fazer coisas moralmente boas e
moralmente más.
A consciência é uma coisa
misteriosa. A consciência sempre nos diz: isto foi mal feito. E também nos
louva de vez em quando - de estar muito bem feito o que fizeste. Quer dizer, há
uma voz em nós que aprova e desaprova o que nós fazemos. Contra a nossa
vontade. Se fosse feita por nós, a consciência, nós não podíamos ter remorsos,
sentimentos de culpa, de maldade. Mas todo mundo de vez em quando, tem a
certeza de que ele é culpado, que ele fez mal, que ele não devia ter feito, que
deve se arrepender e ter remorsos. Isto é universal na humanidade.Logo a
humanidade supõe que haja diferença essencial entre o bem e o mal.
Bem, isto como início, mas,
como vamos explicar isto filosoficamente...- sem entrar em nenhuma teologia. Eu
já tentei isto uma vez, mas não terminei. Vamos fazer mais uma vez a mesma
linha que fiz em outra ocasião. Vamos fazer a linha da evolução humana que
começa lá em baixo, vamos dizer, começa com um e pode ir até 100 e muito além
de 100. Não precisa acabar aqui. Porque a evolução é indefinida. Ela não acaba
nunca. Não tem um ponto final.
Bem então, vamos marcar três
estágios evolutivos. Um estágio evolutivo – início da humanidade. Marcar aqui
um outro estágio evolutivo mais adiantado. E aqui um terceiro estágio
evolutivo. Isto nós podemos dar três nomes a estes estágios evolutivos. Isto na
Bíblia se chama o Éden, o paraíso terrestre, onde o homem não era bom nem mau.
Era neutro. Ele era inocente como qualquer animal, como qualquer planta. Claro,
o animal sempre é inocente, nunca tem pecado. Então o homem praticamente estava
aqui no princípio. Ainda não tinha despertado nele isto aqui. Começa a divisão
aqui. Mas como o homem foi saindo do Éden, do paraíso, foi até o segundo
estágio de evolução em demanda do 3o, mas não está no 3o.
Com as palavras de Teilhard de
Chardin, este grande cientista do nosso século, isso seria biosfera. Bios quer
dizer vida. Aqui o homem estava na biosfera, quer dizer na pura natureza. Sem
diferenciação entre bom e mau. Então o homem foi caminhando na biosfera, aqui
ele entrou na noosfera, segundo Teilhard de Chardin. Noos quer dizer
inteligência. Aqui ele devia entrar na logosfera onde não estamos ainda.
Teilhard de Chardin usa palavras gregas. Então, no princípio estávamos na
biosfera, na esfera da vida, da natureza, depois entramos na inteligência, noos
em grego. E aqui estamos nós praticamente. Estamos demandando isto. Alguns
alcançam aqui (logosfera), mas a humanidade toda não alcançou.
Esta biosfera é um estado mais
ou menos neutro, onde não somos nem bons nem maus, ainda. Porque se não temos a
função do livre arbítrio somos como uma criança recém nascida. Ela pode mais
tarde adquirir o livre arbítrio, mas uma criança recém nascida está
praticamente na biosfera. Ninguém pode dizer que ela é virtuosa ou viciosa, uma
criança recém nascida. Ela não tem culpa nem merecimento. Não pode ter culpa
nem merecimento porque isto supõe a função do livre arbítrio. Na criança não
está funcionando nenhum livre arbítrio. Nem pró nem contra. Quer dizer que a
criança não pode ser moralmente boa nem moralmente má. Ela pode ser isto
fisicamente, mas não moralmente.
Então podemos dizer, isto é
estado inicial da humanidade. Ponto mais baixo da nossa humanidade. Podemos dar
outros nomes a este estado. Freud chamaria isto id. Quem estudou lá as
coisas de Freud sabe que ele faz distinção entre o id que é palavra
latina, quer dizer neutro. O que não é masculino nem feminino é chamado id em
latim. E Freud usa o estado neutro dizendo que era o nosso id. O nosso
inconsciente... - quando nós somos inconscientes não somos nem positivos nem
negativos. Nós não praticamos o bem, nem praticamos o mal, quando somos
inconscientes – no estado de sono, por exemplo, nós estamos numa espécie de id.
Estamos numa espécie de naturalidade moral. Não somos responsáveis por nada que
acontece. E uma criança está no id. Quer dizer, no estado neutro, nem
positivo nem negativo.
Isto Freud chamaria o ego – que
nós também usamos o termo ego que é palavra latina para Eu. Mas, usamos a
palavra latina ego para diferenciar do Eu – que é português. Porque já temos a
palavra egoísmo, etc. cuja base é ego. Então vamos dizer que no 2o
estágio de acordo com Freud também, ego. E se adiantarmos mais, segundo Freud
teríamos o superego. Mas nós vamos
simplificar a coisa e dizer, no Eu. Seria o itinerário evolutivo – o homem
começa no id. No anterior ao moralmente bom e ao moralmente mau.
Mas, acontece que a evolução
não pára. E ele saiu do paraíso terrestre e foi expulso. Está aqui agora. Aqui
começa a tal história do pecado. Então ele se tornou pecador. Antes ele era
inocente. Não era inocente por perfeição, por favor -, os teólogos pensam que
nós éramos inocentes por perfeição. Não, nós éramos inocentes por imperfeição.
Um animal não é inocente por perfeição. É inocente por imperfeição. Uma criança
não é inocente por perfeição. Ela é inocente por imperfeição. Por falta de
evolução ela é inocente.
Portanto, pode haver uma
inocência negativa, isto é, por imperfeição. Aqui também poderia haver uma
inocência por perfeição. Se nós estivéssemos aqui, então nós seriamos
inocentes, sem pecado, por perfeição absoluta. Estado do Cristo, mais ou menos,
aqui seria o estado crístico que no Evangelho é chamado Logos.
Mas, nós não estamos aqui. Não vamos ainda
deliciarmos com esta perfeição - esta inocência por perfeição. Já saímos da
inocência por imperfeição. Mas, não atingimos a inocência por perfeição. É
claro que não atingimos. Pode ser um ou outro, mas o grosso da humanidade não
conseguiu. Nós estamos praticamente entre o id e o Eu. Entre a
biosfera e a logosfera. A humanidade está toda praticamente aqui.
Quer dizer, há uma evolução que
começa aqui numa natureza pura, vai subindo, desenvolvendo, pouco a pouco, aqui
adquirimos a consciência do ego. Nesse estágio aqui, esse bios, este ser vital
(bios é vida), este organismo vital... - é claro que nós viemos do organismo
vital. Nós não viemos do barro como muitos pensam. Nós viemos de um ser já
vivo. Antes de sermos intelectualizados aqui, nós viemos duma base de
vitalidade já formada, mas sem intelectualidade. (aqui é vitalidade sem
intelectualidade). Aqui é id sem ego. A intelectualidade é o ego e a
racionalidade é o Eu.
Então fomos expulsos, dizem os
teólogos, do paraíso terrestre porque nos tornamos pecadores. Quer dizer, a
expulsão é a passagem do id para o ego, claro!... É uma questão de
evolução, mas eles pensam que é uma queda. Um desastre, uma catástrofe que deve
ser neutralizada. Filosoficamente nós não podemos aceitar isto. A necessidade
da evolução nos expulsou da biosfera e nos introduziu na noosfera. Nós estamos
agora na intelectualidade.
Aqui começa o nosso livre
arbítrio, mas imperfeito ainda. Aqui não há livre arbítrio nenhum. Aqui há um
semilivre-arbítrio, não um plenilivre arbítrio. Aqui não há um livre arbítrio
perfeito, mas o início. Aqui nós já somos responsáveis pelo que fazemos. Somos
responsáveis pelo bem e somos responsáveis pelo mal. Andamos em eterno conflito
entre o bem e o mal. É o nosso estado atual de hoje.
Bem, então aqui seria o 2o
estágio de evolução. Daqui em diante é possível o pecado. Aqui não é possível o
pecado. Logo, se os teólogos falam em pecado e redenção, é claro que eles falam
desses dois estágios evolutivos. Toda a teologia gira entre esses dois pontos
do ego e Eu. Em linguagem filosófica nós chamamos isto o estágio do ego, da
inteligência, mas ainda não da razão. Cuidado, não confundir inteligência com
razão. Então nós estamos aqui em estado de pecado porque aqui nós temos um
livre arbítrio parcial, mas ainda muito incompleto - muito fraco. Às vezes
fazemos o mal, então prevalece o nosso negativo e às vezes fazemos o bem,
prevalece o positivo. Quer dizer é um eterno jogo entre positivo e negativo.
Toda a nossa vida ego atualmente é um jogo permanente entre positivo e
negativo.
São Paulo descreve isto
dramaticamente na epístola aos romanos: “o bem que eu quero fazer isto eu
não faço e o mal que eu não quero fazer, isto eu faço. Que enígma sou eu” -
ele diz - “quem me libertará deste corpo mortífero”. Quem me libertará
deste ego, nós diríamos, porque o bem que eu quero fazer não o faço. E o mal
que eu não quero fazer eu faço. Há dentro de mim duas leis. Paulo de Tarso diz
isto. “Há dentro de mim a lei do bem e a lei do mal; estão em eterno
conflito. Quem me libertará deste modo infeliz? A graça de Nosso Senhor Jesus
Cristo”. Ele exclama no fim.
Ele quer dizer, enquanto eu
estou no 2o estágio de evolução...- o jogo entre o sim e o não,
entre o positivo e o negativo, eu não tenho sossego. Mas algum dia eu vou ser
liberto por isto. Isto ele chama a graça do Cristo. É o logos, é claro! Ele
tinha uma intuição certíssima, mas os nossos teólogos não sabem explicar isto
filosoficamente. Nós devemos chegar a uma explicação inteiramente independente
de qualquer teologia. Simplesmente pela razão.
Então o homem está aqui. Aqui o
homem se tornou pecador. Aqui ele não era pecador e aqui ele pode ser santo,
mas aqui ele não é inocente nem por imperfeição nem inocente por perfeição. Mas
está entre dois estágios evolutivos. Isto então na teologia se chama a queda. A
queda do homem é a entrada da biosfera para dentro da noosfera. O estado de
inconsciência para o estado de semiconsciência. Aqui não tem pleniconsciência.
Mas a inconsciência se transformou e semiconsciência. O ego nunca é
pleniconsciente. Ele não é positivo - que seria pleniconsciente. Ele é
parcialmente negativo e parcialmente positivo.
Então estamos aqui...- que eles
chamam pecado. Mas, não no sentido teológico, que nós tenhamos caído neste
pecado por culpa de algum diabo que veio de fora. Eles pensam que o pecado do
homem aconteceu porque veio um fator externo, a serpente que é o símbolo do
diabo, eles dizem; e este diabo nos empurrou para baixo. Isto é teologia. Mas
isto nós não aceitamos na filosofia. A serpente de que fala Moisés era a nossa
inteligência, mas os teólogos pensam que era o diabo. A nossa inteligência às
vezes é diabo. Também, às vezes é Cristo.
Quando estamos no positivo podemos dizer, este é o nosso Cristo interno,
mas também estamos no negativo também é o nosso anticristo interno.
É claro, nós tínhamos que
passar do neutro da biosfera para um misto de positivo e de negativo. A
bifurcação das linhas, onde começa o livre arbítrio. Mas um livre arbítrio
muito incompleto, muito frágil, muito vacilante de cá para lá. E nunca podemos
dizer de um dia para o outro se amanhã ainda vamos ser tão bons como hoje, ou
tão maus como hoje. Não sabemos. Nós podemos variar de um momento para o outro.
Porque tudo é instável e vacilante enquanto estamos na zona do ego, na
noosfera.
Então falam os teólogos em
redenção. Redenção seria isto aqui, a passagem...
-Se, por exemplo, nós estamos
nesse estágio de evolução do ego para o Eu, a gente perde a matéria.
Continuaria essa evolução?
Escute, esta matéria nada tem a
ver com esta evolução. Esta evolução é puramente mental. Que tenhamos um corpo
físico, ou sem corpo físico, não muda a nossa mentalidade. Não devem fazer
depender o nosso estado de evolução de um corpo material ou sem corpo material.
Isto nada tem que ver. Porque quem decide não é a matéria. A matéria não é
responsável por nenhum pecado. A mente é a única responsável pelos pecados. A
mente é o fator decisivo da nossa evolução. A mente, a parte intelectual que
também se chama mente. A palavra mente, às vezes é tomada nesse sentido aqui.
Espiritual. Mas geralmente nós usamos a palavra mente, mental no sentido
intelectual. Quando eu digo aqui mente, eu entendo intelectual. Porque a
palavra mente tem dois sentidos. Ela tem um sentido bom. A mente. E tem um
sentido mau também. Tem um sentido positivo e tem um sentido negativo.
Em inglês só se usa a palavra ‘mind’
que corresponde à nossa mente (mens- mentis em latim- deu mente em
português e mind em inglês). Os ingleses quase usam mind no
sentido disto aqui. Science of mind – a ciência da mente - eles entendem
a ciência espiritual é uma revista lá da Califórnia que eu recebi muitos anos.
Ciência da mente eles chamam a ciência do espírito. Isto é o modo de aceitar a
palavra mente porque a mente pode ser aceita em 2 sentidos. A mente pode ser
uma nuvem. Se eu olho a nuvem de cima ela é toda luminosa, porque é batida pelo
sol. Se eu olho esta nuvem de baixo ela é toda escura. A mente é como isto. Ela
é luminosa por um lado, mas ela é escura por outro lado. Se eu chamo mente a
parte espiritual da inteligência, a parte boa, a parte positiva, então a mente
é isto, esta parte superior. Mas se eu falo da mente em sentido negativo então
eu entendo por mente a inteligência, o intelecto, o noos. Eu, nestas aulas vou
falar somente da mente no sentido do intelecto e não no sentido de espírito.
Então aqui nós temos corpo, mas
o nosso corpo não é bom nem mau. Moralmente bom não é o corpo, nem moralmente
mau. O corpo não pode ser moralmente responsável porque o corpo pertence a isto
aqui. O corpo está ainda na biosfera. O corpo nunca vai sair da biosfera. É o
nosso invólucro material. É o nosso invólucro animal. Não vão dizer que o corpo
comete pecado. O corpo não comete nenhum pecado. A mente é que é pecadora. O
corpo também não tem virtude. O corpo não é virtuoso e não é vicioso. A mente é
que pode ser virtuosa e pode ser viciosa.
Então tomemos a mente aqui,
tenha corpo ou não tenha corpo - isto é completamente indiferente. Vocês não
devem pensar que vamos perder o livre arbítrio porque perdemos o corpo. Não é
verdade! Ninguém perde o livre arbítrio pelo fato de ter perdido o corpo. Nós
somos tão livres depois da morte como antes da morte. Muitos pensam que até o corpo
seja um impedimento para o desenvolvimento do livre arbítrio e que seja melhor
não ter corpo material para desenvolver a mente, do que ter corpo material.
Bem isto são opiniões
particulares. Em todo caso o corpo não é a sede do livre arbítrio. Não é a sede
do mal e não é a sede do bem. Quem é a sede é unicamente o nosso ego mental,
mas não o nosso ego físico. Não vão atribuir ao seu ego físico as suas
maldades. O corpo não pode ser pecador. O corpo não pode também ser santo. Quem
pode ser pecador e quem pode ser redentor que é o contrário de pecador é a
mente.
Quando a mente é positiva nós
chamamos virtuosa. Quando ela é negativa nós dizemos, viciosa. São estágios de
evolução. Aqui nós estamos oscilando entre pecado e redenção. Aqui não estamos
definitivamente na redenção. O nosso Eu
não é redentor aqui. Aqui o nosso ego às vezes parece ser redentor e nos redime
do pecado. E depois verificamos que ele não é ainda redentor. Que nós estamos
vacilando sempre entre dois pólos. Entre o positivo e o negativo. Entre o bem e
o mal. E isso se chama o pecado original.
Quanto se tem escrito e
discutido em torno de pecado original. Isto é o pecado da nossa origem, mas não
é a herança de um casal que tenha pecado e nós tenhamos herdado o pecado de um
casal. Isto se diz lá na teologia, mas é insustentável. A teologia se diz, Adão
e Eva pecaram e nós herdamos o pecado deles porque nós somos descendentes
deles. Isto é insustentável. O pecado original faz parte da nossa evolução. Nós
nunca nos podemos libertar do pecado original enquanto não sairmos daqui.
Aqui nós não tínhamos o pecado
original porque não tínhamos ainda livre arbítrio. Depois entramos num livre
arbítrio fraquinho semilivre aqui. Aqui nós entramos na zona do pecado
original. O pecado original não é herança de outros, é evolução de cada um de
nós. Nós todos agora estamos no pecado original. Batizados ou não, isto não
resolve nada. Mas, os teólogos pensam que se a gente recebe um copo d’água na
cabeça e uma certa forma então está fora do pecado original. Ah! Se fosse tão
fácil, que coisa boa seria.
Se eu pudesse progredir deste
para cá... - somente um copo d’água... - ou um mergulho no rio... - isto é
muito fácil. Não, o pecado original faz parte da nossa evolução humana. É a
nossa origem - que a nossa origem é propriamente aqui. Aqui, não é propriamente
a nossa origem. Aqui é apenas a parte material do homem. Mas, onde não há livre
arbítrio ainda não há origem humana. A origem humana começa aqui; onde desperta
o livre arbítrio começa propriamente o ser humano. E com isto nós entramos na
zona do pecado. Isto é, da pecabilidade, não necessariamente dum pecado atual,
mas um pecado potencial.
Aqui nós somos potencialmente
pecadores. Todos nós. O livre arbítrio imperfeito nos torna potencialmente
pecadores. Não precisamos ser atualmente pecadores porque temos o livre
arbítrio de não pecar, mas somos potencialmente pecadores. São Paulo descreve
isto na epístola aos romanos – que muitos não compreendem – que todos os
homens são pecadores. Ele não quer dizer que são atualmente pecadores. Ele
quer dizer que são potencialmente pecadores, isto é pecáveis. Seria melhor
dizer pecável. Cada um de nós é pecável enquanto está na noosfera. Cada um de
nós está com pecado original enquanto não terminou a sua evolução. A única saída
do pecado original é a evolução. A saída é aqui, mas a saída não é um copo
d’água.
-Professor, e qual o
significado de Jesus ter sido batizado por João Batista. Seria...
-Escute, primeiro, vamos ver
mais longe, João Batista nunca batizou uma criança, porque ele não acreditava
em pecado original. Ninguém no Evangelho acredita em pecado original. Nem
Jesus, nem João, ninguém sabe de pecado original. Jesus nunca falou em pecado
original. João Batista nunca falou em pecado original. O que ele fazia com os adultos
(ele só batizava os adultos, aliás, batizava não, batizar é uma palavra grega –
temos que traduzir – mergulhava) – João Batista mergulhava os pecadores
adultos.
Então Jesus pediu que o
mergulhasse. João não quis, por que não quis? Porque ele só mergulhava
pecadores, mas, não mergulhava Jesus porque ele já tinha dito, “eis aí o
cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”. Logo, ele não supunha que
Jesus fosse pecador. Nem pecador criança, nem pecador adulto. Para os pecadores
adultos ele exigia conversão antes do mergulho. Olhem bem! Aos ricos e
poderosos ele dizia, “se alguém tem duas túnicas e vê alguém que não tem
nenhuma, dê uma das suas túnicas a outro”.
Isso é conversão. E se alguém tem o que comer e vê alguém que não
tem o que comer dê uma parte da sua comida ao outro. Isto é conversão. Aos
soldados romanos João dizia: “contentai-vos com vosso soldo e não pratiqueis
violência”. Porque os soldados andavam armados, podiam praticar violência.
Então João diz: “contentai-vos com vosso soldo”. Não pedindo cada dia
majoração de salários. Soldo é aquilo que se paga aos soldados. “E não
pratiqueis violência”. João exige conversão interior, espiritual. E quando
os pecadores estavam prontos a não praticar violência, a se contentar com o seu
soldo, a dar uma parte da sua comida aos outros e a dar a 2a túnica
aos outros, então João os considerava convertidos.
Então João dizia: “A sua
conversão é sincera ou não?” Eles diziam “A nossa conversão é sincera,
eu não vou fazer violência, não vou pedir majoração de pagamento”. Então
João diz: “Então entra na água e prova por um sinal externo que a sua
conversão interna é sincera”. Então João mergulhava o pecador já convertido
interiormente, mergulhava nas águas do Jordão, praticando uma cerimônia muito
simbólica, como São Paulo explica. Porque, isto de mergulhar quer dizer morrer,
isto de sair fora d’água quer dizer, nascer de novo. “Morre para tua vida pecaminosa, nasce para
uma vida virtuosa”, isto era um simbolismo que João praticava.
Ele era muito poeta. “Morre debaixo
d’água para tua vida pecaminosa, nasce para uma vida nova”. João sempre
praticava isto. Mas não era o mergulho, nem a imersão, nem a emersão (porque o
mergulho tem duas coisas, imersão para baixo e emersão para cima) – João nunca
acreditou que um mergulho da imersão e da emersão desse espiritualidade aos
pecadores. Isto ele nunca diz. Isto nós interpretamos errado. Ele sabia que
fulano se tinha convertido interiormente. Já não era o velho pecador. E para
confirmar exteriormente por uma cerimônia simbólica a conversão já ocorrida (o
mergulho não era a conversão, a conversão já estava pronta, ele já se tinha
convertido interiormente, ele só confirmava com uma cerimônia externa a
conversão).
Depois aparece Jesus e pede a
João que o mergulhe. João diz, “não, quem devia ser mergulhado sou eu e não
tu”. Ele conhece muito bem que ele não estava aqui. Mas Jesus estava aqui,
ele era o logos. Mas Jesus insiste: “Façamos por ora tudo que é justo”. Então
João atendeu porque ele compreendeu que Jesus não queria dizer: “Eu sou
pecador e eu tenho de ser mergulhado por ti na água para deixar de ser
pecador”. João compreendeu que isto não era verdade. “Eu devia ser
mergulhado por ti, e como é que tu vens ser mergulhado por mim”. Então
Jesus diz as palavras misteriosas: “façamos por ora tudo que é justo”. Então
João compreendeu o que Jesus quis dizer... O que é que ele quis dizer? Por que é que Jesus disse “façamos por ora
o que é justo?”
-Para as pessoas entenderem...
-Ninguém leu nada sobre os
Essênios, eu estou vendo. Os Essênios moravam no noroeste do mar Morto. Eu
estive lá. Era uma sociedade mística e ética muito rigorosa e evidentemente
Jesus e João foram membros dos Essênios. Não há dúvida nenhuma. A doutrina de
Jesus é a dos Essênios. Eles fizeram parte da comunidade dos Essênios. Depois
se separaram. João esteve toda a sua juventude no deserto, diz o texto. Mas,
aquilo é deserto. Vocês pensavam que ele andava lá fora? Não, ele estava na
comunidade dos Essênios. João Batista, e Jesus também tinham estado lá.
-É uma comunidade só
masculina...
-É, só masculina porque há
rigoroso celibato voluntário e não tinha mulheres entre eles. Então, eles eram
ascetas terríveis. Então, os Essênios praticavam constantemente o mergulho,
muitas vezes na vida e não uma vez. Todos os Essênios praticavam o mergulho.
Toda vez que o Essênio mudava de profissão ou de ocupação qualquer, ele fazia o
mergulho. Imersão e emersão. A imersão quer dizer, morte para uma atividade e a
emersão é nascimento para uma segunda atividade. Isto era o que Jesus pediu a
João. “Eu vou começar uma outra atividade agora”.
Porque ele tinha estado 30 anos em Nazaré,
numa solidão quase completa. Trabalhando na carpintaria e fazendo muita
meditação. É claro que ele vivia dias inteiros em meditação. Sem dúvida nenhuma.
Agora ele diz, eu terminei o meu período místico, meu período de eremita. Ele
era um eremita, é claro. 30 anos! Desde 12 até 30 - são dezoito anos completos,
ele não aparecia em público, ele não falou ao povo. Não curou ninguém, não
ensinou ninguém.
Quer dizer, ele levava uma vida
de místico solitário. Aos 30 anos ele apareceu e diz: “João terminei o 1o
período da minha vida mística. Eu vou começar agora uma vida social de curador,
de pregador, etc... no meio do povo”. Levou três anos de vida social no
meio do povo. “Portanto, mergulha-me, faça o que é justo”. Ele disse,
ele se refere aos Essênios. “Tu sabes que nós, os Essênios, sempre quando
terminávamos uma ocupação e começávamos outra, praticávamos o mergulho; então,
faça o que é justo, mergulha-me”.
Então João fez isto, o
mergulhou e o fez sair da água. Isso é que Jesus quer dizer. “Façamos o que
é justo conforme o nosso costume dos Essênios”. Isto é o que ele quis
dizer... Bem, mas estamos desviando do nosso tema. Passou a hora mesmo.
Bem, por enquanto saibam
disto... - a nossa viagem é do inconsciente do id para o semiconsciente do ego
e no semiconsciente do ego nós todos somos potencialmente pecadores. Aqui nós
tornamos pecadores e aqui não seremos. Aqui, no intermediário é que nós somos,
não necessariamente, atualmente. Mas, potencialmente, todos nós somos, porque
quem tem apenas metade da sua liberdade espiritual como nós não temos aqui...-
nós não somos plenamente livres aqui... - nós somos semilivres e semi-escravos.
Semilivres e semi-escravos. Tudo é possível aqui. Se cairmos na escravidão,
então somos pecadores. Se superamos a escravidão, estão estamos libertos por
algum tempo. Sempre oscilando de cima para baixo. É o estágio da nossa
evolução.
Vocês devem explicar a
teologia, não em forma de dogmas, não em forma de credos. Mas em forma de
realidade da vida humana. Porque a vida humana passou por esses estágios. Nós
estamos em plena evolução. Nós saímos de lá do Éden, nós nos expulsamos pela
nossa evolução. Cada um de nós se expulsou do id para entrar no ego. Estamos
atravessando a nossa passagem pelo ego. Isto é pecado. Aqui nós somos todos
pecadores, não atuais, mas potenciais. Todos somos. Porque não estamos garantidos, quanto a quedas e
recaídas. Enquanto estamos no ego vamos oscilando de cá para lá. Às vezes
ficamos muito tempo no positivo e depois caímos no negativo. Outros ficam
permanentemente no negativo. É culpa deles. Podiam estar no positivo também,
mas, não querem.
Então mais tarde, depois do
pecado vem a redenção. A redenção não vem de fora. A redenção é uma fase da
nossa evolução. Não existe alo-redenção. Existe só auto-redenção. Ninguém me
pode redimir exceto eu. E ninguém me pode fazer pecador, exceto eu. Pecado e
redenção vem de nós mesmos. Isto os teólogos não podem compreender. Pecado e
redenção vem de nós, da nossa natureza humana, imperfeita ou perfeita.
-Nós não somos culpados pelos
pecados dos nossos antepassados...
-Não, não, ninguém pode ser
culpado pelos pecados dos outros, acabou-se a história... Eu não posso ser culpado
pelo pecado de nenhum de vós e vós não podeis ser culpados pelo meu pecado.
Cada um de vós pode ser culpado pelo seu pecado pessoal. Ele tem o livre
arbítrio para si, mas não tem o livre arbítrio para os outros. É claro, vamos
retificar as nossas idéias. É necessário que tenhais clareza sobre isto, porque
há uma confusão imensa, há dois mil anos. Erros fossilizados nesse terreno.
Temos que retificar e elucidar para que vocês possam defender a idéia de pecado
e redenção.
Nós não podemos abolir as duas idéias.
Devemos elucidar. Nós não podemos dizer que não há pecado. Também não podemos
dizer que não há redenção. Há pecado e há redenção, mas não no sentido em que a
teologia quer, mas em outro sentido, muito melhor e muito mais profundo. São
estágios da nossa evolução humana muito imperfeita e precária por enquanto.
Porque o batismo vem com a evolução superior. Se nós chegarmos até aqui na
logosfera então não precisa nenhum copo d’água. Pela nossa própria evolução
mental e agora espiritual, porque o mental agora se converte em espiritual
aqui. Nós estamos completamente redimidos de qualquer pecado e suas
conseqüências. Vocês devem pensar em termos de filosofia correta.
-O Senhor disse que a
humanidade está atualmente no meio, no estágio ego. Do id para o ego em demanda
do Eu. Há um processo para acelerar a passagem.
-Bem sobre isso ainda vou falar
numa próxima hora. Agora vou só mencionar. Aqui, nós somos um composto de
positivo e negativo. O nosso ego por fora é muito negativo. Por dentro também é
positivo, porque o nosso Eu já está embrionariamente contido no nosso ego. Não
se esqueçam. Isto que nós vamos alcançar um dia já está embrionariamente
contido no ego, mas não se manifestou.
Quando nós descobrimos o nosso
Eu dentro do nosso ego, notem bem, quando nós descobrimos o nosso Eu, logos,
dentro do nosso ego, noos... - então nós estamos em caminho de evolução
superior. Isto se chama hoje em dia autoconhecimento. Quando eu entro no
autoconhecimento e me conheço não como um ego negativo, mas como um Eu positivo...
- eu sou negativo por fora, mas eu sou positivo por dentro. Se eu olho de fora
para dentro e digo: “eu não sou somente o meu ego negativo, que é uma
casquinha, eu sou também o meu Eu positivo, se eu conscientizar o Eu positivo
dentro do meu ego negativo, então eu faço autoconhecimento, é o único caminho
da evolução, se eu vivo de acordo com meu autoconhecimento eu vou fazer um
progresso rápido rumo a logosfera”.
Isso é unicamente uma questão
de evolução consciente. Nós devemos conscientizar aquilo que somos. Nós somos o
nosso ego por fora, mas somos o nosso Eu por dentro já agora. Nós já somos
isto. Vamos pintar assim. Isto é a nossa natureza humana por enquanto. Por
fora, tudo negativo. Mas por dentro nós já somos isto.
Quando nós não temos conhecimento
exato de nós, nós dizemos que somos tudo isto negativo, ego, ego, ego...-
fazemos uma entrada para nosso interior. Isto se chama meditação para
autoconhecimento. Então descobrimos, “eu não sou somente o meu ego externo,
físico, mental, emocional, eu sou também o meu Eu interno, espiritual, eu já
sou potencialmente na logosfera, eu estou atualmente na noosfera, mas dentro de
mim já existe isto... já está aqui, eu ainda não conscientizei a realidade e
não vivi de acordo com a realidade”. Então o grande mestre diz: “Conhecereis
a verdade sobre vós mesmos e a verdade vos libertará”. Que grande palavra. “Conhecereis
a verdade sobre vós mesmos... (aqui) eu também já sou espírito por
dentro... e o conhecimento da verdade vos libertará de toda esta miséria
aqui”. Aqui nós estamos libertos, aqui é completamente libertação. Aqui
estamos semi-escravizados e semilibertos. Aqui estamos plenilibertos. Aqui
estamos semilibertos.
-A criança já tem a
potencialidade do logos?
-Tudo está lá. Tudo está em
qualquer ser humano. O homem não foi animal. O homem foi homem desde o
princípio. Mas, a sua potencialidade era tão fraca que não se manifestou. O
homem foi homem desde o princípio da creação. Agora ele se manifesta pouco a
pouco. Primeiro como mente, depois como espírito.
TRANSCRIÇÃO DA AULA 14 - O Homem Potencial
Curso Filosofia Univérsica
As minhas
aulas não são para os veteranos. Nós temos aqui veteranos e veteranas, cinco
anos, dez anos, vinte e tantos anos, alguns estão aqui. Minhas aulas são
somente para os principiantes e para os novatos. Porque os veteranos já devem
estar supersaturados, enjoados e enfastiados das minhas repetições; porque
infelizmente na filosofia não se pode fazer nada sem repetir. Não basta
engolir, é preciso repetir. Não basta devorar, é preciso ruminar. E por isso,
eu digo que é, sobretudo para os novatos, para os principiantes, e não para os
veteranos que estão supersaturados dessas repetições. Nós temos que repetir
muitas vezes a mesma coisa para assimilar. Não basta engolir, é preciso
assimilar. Isso não se pode fazer muito depressa. Engolir é um instante, mas
assimilar leva tempo.
Então
vamos voltar ao nosso tema: o homem esse desconhecido. Porque todo mundo
escreve livros sobre o homem e todo mundo confessa que é um enigma, um paradoxo,
um X, um desconhecido, etc... Mas, por que isso é assim? Porque eles se baseiam
em duas hipóteses das quais nós não aceitamos nenhuma. Ao menos, eu não. Essas
duas hipóteses de fato fazem do homem, um desconhecido, um enigma, uma esfinge;
ou talvez o melhor de tudo, como disse Pascal, uma miscelânea de misérias e de
grandezas. Isso chega perto da solução, mas não é bem uma solução. Uma
miscelânea de grandeza e de miséria, disse Pascal.
Há
duas hipóteses correntes por aí. Uma de 2000 anos e outra de 100 anos apenas,
não são aceitáveis. Nós não podemos aceitar, nem a hipótese teológica que já
tem 2000 anos, nem sequer a hipótese assim chamada cientifica, que tem apenas
um século. Porque ambas são fora da lógica e fora da matemática. E nós temos
que argumentar dentro da lógica e dentro na matemática.
Todos
sabem e eu repito que a hipótese teológica é esta: que o homem foi colocado
aqui neste mundo diretamente por Deus, imagem e semelhança de Deus. Quer dizer,
uma perfeição absoluta. Se ele é a imagem e semelhança de Deus, é claro que era
100% perfeito, 100. Imagem e semelhança de Deus tem que ser 100. Então ele foi
colocado aqui nessas alturas. Isto era o homem primitivo, o Adão.
Adão não é o
nome dele, é um apelido, e Eva também não, como todo o mundo pensa. São
apelidos. Adão quer dizer, o primeiro ego. E Eva quer dizer: reflexo, imagem.
Então
Adão teria sido 100% de perfeição. Soa muito bem no princípio. Que coisa
maravilhosa Deus fez no fim do 6o dia da creação! Ele disse que era muito
bom. Quando Ele fez as creaturas, o
Gênesis diz que era bom. E quando creou o homem diz que era muito bom.
Isto era muito bom. Mas aconteceu segundo nós entendemos isto: caiu de
100 para 1 - a queda do homem. A queda desastrosa, catastrófica do homem.
Isto nos foi
ensinado, isto nos fomos aceitado e isto encontra até hoje em toda a teologia.
Por que é que não podemos aceitar isso: a queda de 100 de perfeição para 1? Não
para zero, porque ele continua a ser homem. Zero não seria mais homem. Ele
continua a ser homem, mas um homem imperfeitíssimo.
Isto é uma hipótese insustentada. Eu não falo contra
o Gênesis, eu falo das nossas interpretações do Gênesis. Eles não sabem
interpretar o Gênesis porque o Gênesis é uma intuição cósmica, mas as nossas
análises intelectuais erram em todos os sentidos. Porque a culpa não é do
Gênesis, nem de Moisés. A culpa é das nossas interpretações. Nós interpretamos
assim: caiu de 100 para 1. Aqui no abismo.
A queda do homem é uma queda catastrófica.
Bem, e depois
há uma tentativa de reerguê-lo, a ver se chega outra vez a 100. Isso chama
redenção. Então há duas coisas creação, queda e redenção. Isto é aceitável nas
explicações que nós tomamos, por duas razões. Primeiro um homem 100% perfeito
não podia cair. Cair pode um homem semiperfeito e muito imperfeito, mas, um
Cristo (isso seria um Cristo, é claro!) Como é que pode cair sem mais nem menos
de 100 para um 1. Não é possível, é contra toda a lógica! E quem foi esse
poderoso anti-Deus que o fez cair? O diabo. Esse diabo é mais poderoso que
Deus. Tudo isso é inaceitável perante o bom senso e a lógica.
Portanto temos
que abandonar - queiramos ou não queiramos - a hipótese teológica que é a mais
conhecida. Não é possível esse ilogismo, não é possível aceitar que um homem
perfeito, um Cristo, tenha caído de 100 para 1. Aquele outro Cristo que
conhecemos pelo Evangelho não caiu. Lá na tentação aquele anticristo fez todo o
possível para ele poder cair. Prometeu-lhe todos os reinos do mundo e sua
glória, se o Cristo se prostrasse em terra e o adorasse como Deus. Queda é
claro, catastrófica! Nada disso aconteceu. Cristo ficou em pé e não caiu. Como
um obelisco não caiu por terra. E disse ao anticristo: vai à minha
retaguarda, e vá de retro, (retro é retaguarda em latim) porque só a
Deus adorarás e só a ele servirás. Ficou em pé, firme.
E este que era
uma espécie de Cristo, como é que caiu? Desastradamente! É claro que não
podemos aceitar isto. É contra a lógica. E o diabo seria tão poderoso para
derrubar uma obra de Deus, perfeita. Vamos acabar com essa história que o homem
tivesse entrado no mundo perfeito. Não é possível! Essa é a teoria teológica.
Depois vem
aquela outra do século passado, a chamada darwinística ou científica. Bem, lá
se diz que o homem não era homem no princípio. Era zero, depois se tornou
homem, 1. Foi do animal, do não-homem que é o zero, o não-homem se tornou
homem. Eu não sei, sobretudo, de que lógica nós podemos fazer 1 de um zero. Não
dá. Se o homem no princípio não era homem, era animal puro aqui, um mamífero
qualquer, como é que agora se tornou pouco a pouco homem? Até hoje, nunca mais acontece
isto. Nenhum animal se torna homem. Em milhares de anos não se tornou. E
continuou a sua homificação.
De maneira que
essa estória do darwinismo, do zero para o 1 e depois do 1 para a evolução como
eles querem... A dificuldade não é a evolução, isso seria possível, mas a
dificuldade é a transição do zero homem para o 1. Não sei com que lógica se
pode justificar essas coisas.
De maneira que
vamos tentar uma terceira alternativa. Já que as alternativas: teológica e a
chamada cientifica, não satisfazem, temos que adotar logicamente o seguinte; o
homem entrou nesse mundo, homem grau 1. Não zero, mas 1. Já era verdadeiro
homem, mas um homem muito atrasado. Muito imperfeito, mas não era zero, porque
transição do zero para o 1 não há. Mas, podemos aceitar que ele entrasse 1.
E teve ordem
de chegar até 100. Esta história de
imagem e semelhança de Deus não é aqui. A imagem e semelhança de Deus - é
aqui. Ele não era atualmente uma imagem
e semelhança de Deus. Ele era potencialmente isto. Isto é razoável.
Potencialmente ele foi creado para o fim de se tornar algum dia imagem e
semelhança de Deus. Por isso ele recebeu como diz o Gênesis o sopro divino. O
sopro divino o tornou potencialmente isso. Mas não atualmente. Os teólogos
pensam que ele é atualmente, 100% perfeito. Mas, isto é insustentável. Ele era
apenas potencialmente 100%, mas não atualmente. Então ele começou realmente com
1. Ele não caiu, ele foi creado aqui mesmo, ninguém o derrubou. A creação
começa com 1. Os outros seres eram creados sem a potencialidade de se tornar
homens. Ficaram atualmente animais, como até hoje. O único ser que foi creado
com a potencialidade, com o poder, com a possibilidade de se tornar mais tarde
o que devia ser imagem e semelhança de Deus.
Agora começa
aqui a evolução. A evolução começa não com 100. Não com zero. Os teólogos
querem 100, eles não aceitam mesmo a teoria da evolução. Mas os cientistas
querem zero. Não podemos começar nem com 100, nem com zero. Então vamos começar
com 1. E a evolução não foi em linha reta. Se a evolução fosse em linha reta
não haveria dificuldade, mas isto não é possível. Porque a evolução foi em
ziguezagues de toda espécie e diminuindo cada vez mais. Vamos fazer uma linha
assim. Assim é explicável.
Com a evolução
em altos e baixos. Não a evolução rápida em linha reta. Milhares de anos que
estamos fazendo esse ziguezague aqui. Essa serpentina - vamos dizer melhor. E
nessa serpentina está o caminho da nossa evolução. Entre 1 e 100. Eu não
garanto que seja 100. Eu creio que pode ser além de 100. O Cristo disse que nós
podemos ir além dele. Vamos dizer que 100 é do Cristo. Mas, ele disse: vós
fareis obras maiores do que eu. Então podemos aceitar, podemos ir até além
de 100 – mas vamos por enquanto marcar a chegada 100 - para termos um ponto
fixo entre 1 e 100.
Bem, o homem
começou a sua jornada aqui, há milhares e milhões de anos provavelmente. Eu
creio que nós estamos há milhões de anos aqui na terra. Não começou há milhares
de anos atrás, não – estamos há milhões de anos aqui. Mas, entre 1 e 100. Nós
estamos perto de 1, talvez aqui (2) ou em qualquer ponto. Essa viagem é enorme,
de milhões de anos. E dentro desta viagem em serpentina há dois fatores que nos
levam à evolução. Dois fatores necessários para nossa subida. Um positivo e um
negativo. Se não há dois fatores contrastantes não há evolução. Em todo
universo não existe evolução sem resistência – como diz o livro: A Gnose de
Princeton. Resistência é o conflito ente dois pólos aparentemente opostos,
realmente complementares. Mas, eles lutam entre si como se fossem contrários –
são complementares.
Então vamos
dizer – havia o positivo, vamos pôr no ponto mais alto o positivo, e o negativo
aqui no ponto mais baixo. Nós estamos acostumados usar positivo para Eu – e
negativo para ego – nos pólos – (psicologia).
Isto então seria o Logos na qualificação de Teilhard de Chardin. A
razão. E isto seria o noos, a inteligência. Podemos usar positivo e negativo.
Podemos usar Eu e ego. Podemos usar Logos em grego e noos em grego. É tudo a
mesma coisa. Apenas são outras palavras. Ou até em sânscrito: Atman e Aham.
Aham é o ego. Em qualquer língua vocês podem usar isto. Mas vamos ficar com o
nosso português, Eu e ego. Aliás, ego é latim. E positivo e negativo. Isto é
claro!
Então o homem
teve que traçar a sua viagem através da antítese entre positivo e negativo. Por
quê? Porque sem antíteses não há síntese. Ele devia fazer esta síntese aqui, é
claro. Mas, não fizemos ainda, vamos fazer algum dia talvez. A síntese é a
união de dois pólos antitéticos complementares. Se os pólos fossem contrários
não havia complementaridade. Mas como eles são realmente complementares pode-se
estabelecer uma síntese entre duas antíteses. Entre a antítese positiva e a
antítese negativa. É uma antítese – uma oposição. Entre esses dois pode haver
um consórcio. Eles brigam sempre entre si, mas o final é a síntese. A
finalidade das leis cósmicas não é uma eterna briga entre os dois. Não, é um
conflito temporário – talvez de milhões e milhões de anos para promover a
subida, a evolução. Porque todo o universo é feito assim. Contraste produz
evolução. Onde não há contraste não há evolução. Onde não há antíteses, não há
síntese. É preciso que haja antíteses complementares e não antíteses
contrárias. Senão não daria síntese. É
lógico! Então aqui há antíteses complementares. E o que é que se chama agora a
queda. É claro que isto aqui é uma queda. Este abismo aqui é uma queda. Isto
aqui é uma subida, mas a coisa já começou com queda, então vamos apagar isto
aqui. Pôr o outro aqui, melhor.
> + Sibilo da serpente
Se já desde o
princípio segundo o Gênesis houve este negativo, este ego que prevaleceu contra
o Eu então podemos dizer: isto é uma espécie de queda. Mas, não uma queda
desastrosa, calamitosa. Ela estava dentro das leis cósmicas. A evolução não era
possível sem altos e baixos. Isto é um baixo, isto é um alto. Depois vêm outros
baixos.
Quer dizer:
Primeiro prevaleceu o ego. Agora temos que pôr o Eu aqui porque ainda não
prevaleceu e o Logos que é a mesma coisa. Isto se pode chamar uma queda, mas
uma queda evolutiva, não uma queda calamitosa como pensam os teólogos. Era um
desastre que não devia ter acontecido, de forma alguma. Não, devia mesmo
acontecer. Estava previsto que acontecesse.
Isto aqui se chama o sopro de Deus, no Gênesis. Isso se chama o sibilo
da serpente. A serpente produz um som que chama silvo ou sibilo. Então isto é a
voz de Deus. Isto aqui é a voz da serpente. A serpente sempre foi o símbolo do
nosso ego. Em todas as literaturas do mundo a serpente é tomada como inteligência.
Inteligência é noos – é o ego. O ego é principalmente inteligência. O ego é,
sobretudo mental. Então aqui prevaleceu desde o princípio a serpente. Quer
dizer, o nosso pólo negativo.
O ego, a
serpente prevaleceu desde o princípio, mas depois há subida – depois há quedas.
E, se agora uma queda, nós podíamos figurar assim:
Vamos dizer, o
negativo maior que o positivo, isso é uma ótima configuração para queda. Se o
negativo prevalece sobre o positivo é uma queda. Aqui (>) quer dizer maior.
Aqui o ego prevaleceu sobre o Eu. Aqui o noos prevaleceu sobre o Logos. Aqui a
serpente prevaleceu sobre o sopro de Deus. Muito bem representado, graficamente
assim. Isto é uma queda. Mas, uma queda necessária para a evolução. Não tem
nada fora da evolução. A evolução exige altos e baixos. Exige descida e subida.
Exige positivos e negativos. Exige uma viagem através do ego e do Eu. Nós não
podemos traçar uma viagem só no Eu, nem só no ego. Nós somos um composto de
dois pólos.
O interessante
é que no hino da páscoa... (há um hino que se canta na véspera da páscoa nas
igrejas cristãs – não sei se ainda cantam, no meu tempo se cantava) – na
véspera da páscoa a gente canta aquele hino glorioso que começa: Exultet, em
latim. Exultem todas as turbas celestes, exultem os querubins, exultem os
cristãos - convidam todos os coros angélicos para exultar por causa da
ressurreição do Cristo no dia seguinte. Então, neste hino Exultet tem duas
palavras misteriosas. Lá tem uma glorificação dizendo: Ó culpa Felix, ó
culpa feliz de Adão – Felix culpa – uma culpa feliz. Ó pecado realmente
necessário de Adão para nos trazer tão grande redentor. Está lá, cantam nas
igrejas. Todos os anos. É uma terrível heresia teológica. Mas é uma afirmação
mística.
Quem fez este
hino ninguém sabe. Alguns atribuem a Santo Agostinho – no 5o século.
Eu acho mais parecido com Orígenes. Orígenes estava inteiramente nessa zona.
Orígenes de Alexandria é do 3o século – escreveu coisas grandiosas
que foram queimadas por ordem da hierarquia eclesiástica. Infelizmente os
maiores livros de Orígenes não existem mais. Apenas temos notas dos discípulos
dele. O maior livro de Orígenes foi Apokatástasis – em grego - quer
dizer síntese. Ele fala da síntese entre as duas antíteses. Orígenes, cristão
de Alexandria – dos neoplatônicos de Alexandria. No fim do 2o e
princípio do 3o século. Lá ele diz: graças a Deus que houve uma
culpa feliz! Graças a Deus que houve um pecado necessário! Pode-se falar
misticamente, mas teologicamente, não. Quando a gente fala teologicamente a
gente é herege. Mas, quando se fala misticamente, a gente é um grande vidente.
Então, aqui há
a culpa feliz e o pecado necessário para nos trazer isto, a nossa redenção.
Isto o hino chama a nossa redenção. O nosso negativo combinado com o nosso
positivo dá a nossa redenção. Isto está lá no hino desde o 3o
século. Quer dizer, alguém já teve a visão da evolução através da antítese para
nos levar à síntese. Isto é síntese e isto são antíteses. Mas, a evolução não
se dá senão através de opostos, de contrários, aparentemente contrários que são
realmente complementares.
Agora, eu fiz
a linha assim diminuindo cada vez mais as serpentinas, e finalmente ela acaba
em pouca serpentina. Não acaba nunca. Ela fica sempre uma linha ondulada.
Porque a antítese violenta entre positivo e negativo como é no princípio, pouco
a pouco se torna uma antítese mais suave. Pouco a pouco há um início de tratado
de paz entre os dois. Primeiro era conflito aberto. Ego e Eu - são
absolutamente incompatíveis um com o outro. Isto é no princípio. Um conflito
violento. E parece que não há possibilidade de reconciliação.
Pouco a pouco
através da evolução os dois diminuem. Diminuem cada vez menores. As antíteses não
são mais tão grandes, mais fica sempre o ego e o Eu, porque nenhum dos dois
pode ser apagado, extinto. Porque a natureza humana consiste nisto. Nós não
podemos abolir a natureza humana. Não podemos mandar embora o ego e dizer:
vai-te embora. Não, podemos dizer: vai à retaguarda, mas não podemos dizer,
vai-te embora. Porque ia adulterar a natureza humana. Nós não temos o direito
de adulterar a natureza humana. Podemos conciliar as antíteses aparentemente
opostas e realmente complementares. Isto sim, isto é evolução sensata.
Conciliar os dois, sempre mais e mais.
Mais nunca dá
uma linha reta. Porque a linha reta se abolisse é de um dos dois. Não existe
linha reta na natureza humana. Tem que fazer sempre a serpentina para conservar
a diferença entre o Eu central – o sopro de Deus e o ego periférico, o sibilo
da serpente. Porque esses dois fazem parte da nossa natureza. Nem o Cristo
aboliu. Não aboliu. Às vezes entra uma
luta no próprio Cristo, no Jesus, no Cristo que se fez carne através de Jesus.
Estou falando do Jesus humano agora, e não do Cristo cósmico. Através de Jesus
ainda vai uma ligeira luta entre o positivo e o negativo. Mas uma luta
pequenina assim a pouca distância. Por exemplo: quando ele no Getsêmani pede: Pai,
passa de mim este cálice do sofrimento e da morte, sem que eu beba. Isto é
um grito do ego contra o Eu, é claro! Pai é para ele o Eu. O Pai está em nós.
Então aquele
grito – passa de mim este cálice desse sofrimento sem que eu beba, diz –
o ego. O ego tem medo do sofrimento e da morte, é claro. Naturalmente. Depois
ele acrescenta: mas, não se faça a minha vontade, mas, sim a tua.
Primeiro é o grito do ego contra o Eu. Depois vem a vitória do Eu sobre o ego.
Não se faça a minha vontade do ego, mas faça-se a tua vontade do Eu, meu pai.
Ele chama - Eu – sempre o Pai.
Quer dizer,
havia uma ligeira discrepância ainda entre os dois pólos. No Getsêmani e na
cruz. Ele não bradou em altas vozes antes de expirar: meu Deus, meu Deus,
como me abandonaste! Quem é que grita isto? Não o Eu divino, é claro. Mas o
ego humano. O ego humano ainda está com o último resto de oposição contra o Eu
divino dele, é claro. Porque ele estava numa evolução. Ele estava no fim da
evolução. Nós estamos no princípio. Mas, ele estava lá em cima, quase no fim,
faltava pouquinho. A evolução dele não era ainda 100. Era 98 ou 99. Estava
pertinho da evolução máxima, mas ainda não – vamos dizer que estava no
Getsêmani 98 e na cruz 99 quando ele bradou: por que me abandonaste, meu
Deus! É o ego que grita. O seu ego negativo. Mas, logo depois ele
acrescenta: Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito. É sempre a mesma
coisa. Primeiro tem um grito de luta e depois uma aceitação. Às vezes nós não
chegamos até a aceitação, paramos na luta. Mas ele diz: o meu ego não quer
saber de sofrimento e de morte e do abandono que estava lá no Calvário, mas é
necessário que haja paz entre os dois. Então ele já faz um grande tratado de
paz entre o Eu e o ego.
Notem bem que
não é fácil fazer um tratado de paz entre o ego e o Eu, porque o ego é terrivelmente
inimigo do Eu, diz a Bhagavad Gita. A Bhagavad Gita sempre diz – não há
possibilidade de tratar de paz entre o ego negativo e o Eu positivo. Não há.
Mas a Bhagavad Gita na sua grande sabedoria acrescenta: embora o ego seja o
pior inimigo do Eu, contudo o Eu é o melhor amigo do ego. E por isso pode haver
um tratado de paz. Se o Eu não fosse o melhor amigo do ego não seria possível
um tratado de paz. Uma briga eterna, mas o Eu pode prevalecer sobre o ego.
Aqui
(ego>Eu) é o ego que está prevalecendo sobre o Eu. Mas também pode acontecer
o contrário. Também podemos fazer isto:
Que aqui temos
a vitória do Eu sobre o ego. Aqui temos a vitória do ego sobre o Eu (ego>
Eu). E a derrota do Eu é claro. Aqui (Eu > ego) temos a vitória do Eu sobre
o ego. E incorporação do ego no Eu, Pois, (ego < Eu) - está incorporado.
Está integrado - o Eu conseguiu um domínio completo sobre o ego. O ego não
resiste mais. Ele entregou os pontos e se diz: eu sei que deve ser assim, então
vou entregar-me inteiramente à sua disposição. Isto é o Cristo. Este é o
momento crístico perfeito. Quando há perfeita paz entre os dois litigantes da
evolução. Porque o litígio é necessário, porque sem resistência não há
evolução. Isto é do livro A Gnose de Princeton – dos corifeus da era atômica,
que escrevem este livro.
Não há
evolução sem resistência. E a resistência pode acabar em tratado de paz. Quando
as antíteses acabam em síntese é o tratado de paz. E quem pode fazer o tratado
de paz não é o ego porque ele é sempre inimigo do Eu. Mas o Eu pode fazer o
tratado de paz. Embora o ego seja o pior inimigo do Eu, contudo o Eu é o maior
amigo do ego. Isto é a porta aberta para um tratado de paz entre os dois pólos
litigantes da nossa natureza humana.
De maneira que
só assim nós podemos compreender razoavelmente sem horríveis ilogismos e
contrastes inaceitáveis, a evolução do homem. O homem começou no ponto mais
baixo da sua natureza porque recebeu o sopro de Deus. O sopro de Deus para
evolução. Mas a evolução não se podia realizar só por um positivo, porque o
sopro de Deus é o positivo. Então logo aparece o negativo. Aquela história da
serpente no Gênesis. Nós sempre temos a impressão que isso foi um desastre. Que
não devia ter acontecido. Que Deus não tinha previsto isso, que estava fora dos
planos de Deus. Não é verdade. Estava dentro dos planos de Deus.
Quando
eu estava na escola primária nós tínhamos uma história bíblica ilustrada que
devíamos aprender. E uma vez, lá veio a figura do diabo. Eu não sei. Parece que
era na tentação lá do Evangelho. E a nossa professora muito religiosa disse:
este diabo aí que estragou toda a humanidade. Se ele não existisse seria muito
melhor. Nós seriamos todos santos e maravilhosos. Não haveria doenças, nem
morte, nem nada. Eu fiquei com tanta raiva daquele diabo que tirei a cabeça com
a unha. No papel. Ficou um diabo sem cabeça. Foi aos sete anos por aí. Porque
me disseram que o diabo era o maior inimigo da humanidade e que nós nunca
devíamos ter nada com o diabo porque ele tinha estragado tudo.
É
o negativo, o diabo. É o ego. Jesus também usa a palavra satanás para o ego.
Aquela historia de Pedro - quando Pedro disse uma vez: Mestre, tu não vais
morrer. Jesus tinha dito que ele ia se entregar à morte, voluntariamente.
Pedro disse: não, senhor, tu não vais morrer não. Ele andava todo armado
de espada. Naturalmente ele puxou a espada e disse: nós te vamos defender
contra a morte. Pedro disse isto – muito atrasado ainda. E Jesus disse: Vá
de retro, vai à minha retaguarda, Pedro, satanás. Chamou ele de satanás -
quer dizer ego. Estás falando em nome do ego. O teu modo de falar não é
segundo Deus, mas é segundo o Homem.
Está
muito claro lá no Evangelho. Jesus disse a Pedro: estás falando em nome do
ego – que ele chama satanás. O satanás pode muito bem tomar conta do nosso
ego porque o nosso ego é propriamente o pólo negativo – o diabo, satanás.
De
Judas diz coisa semelhante quando ele fala na sinagoga de Cafarnaum, diz o
texto. De repente ele parou o seu discurso. Jesus olhou para os seus apóstolos
e disse: não escolhi eu a vós 12, entretanto um de vós é diabo. Um de
vós 12 é diabo. Lá ele usa a palavra diabo, que é palavra grega –
satanás é hebraico, mas significa a mesma coisa. É o pólo negativo. Tudo que é
pólo negativo é satanás ou diabo.
Então
diz João que escreve o Evangelho: Jesus disse que um de nós era diabo referindo-se
a Judas Iscariotes. Aquele que o ia entregar mais tarde. Quer dizer, o pólo negativo da natureza
humana é chamado satanás no Evangelho e é chamado diabo, mas não é uma entidade
fora de nós. Os outros logo pensam que é uma entidade fora de nós, que tivesse
tomado posse de Judas e de Pedro. Não é verdade. É o nosso pólo negativo – isto
aqui é diabo (ego>Eu). Isto aqui é Deus (Eu > ego) – isto é espiritual. A
vitória do Eu sobre o ego é um tratado de paz entre positivo e o negativo; é
Cristo, isto é divino. Mas uma luta do ego contra o Eu, a derrota do Eu e a
vitória do ego, isto é chamado satanás.
De
maneira que, só deste modo nós podemos compreender o que está no Gênesis. Mas,
o que está lá nos livros está certo, mas deturparam completamente os livros
inspirados com a nossa análise teológica. Toda teologia é uma análise. A
teologia não é inspirada. Ela é toda analítica. É feita pela inteligência. Como
é que a inteligência podia descobrir uma intuição espiritual. A inspiração é
por intuição espiritual. Por intuição, ou inspiração, ou revelação, tudo isto é
a mesma coisa. Mas quando a inteligência se mete a interpretar uma intuição,
diz só bobagens.
São Paulo compreendeu isso muito bem. Então
ele escreveu na epístola aos Coríntios: o homem intelectual não compreende
as coisas do espírito. É muito claro, o homem intelectual (ego > Eu) não
compreende as coisas do espírito que é isto aqui: (Eu > ego) que lhe parece
estultícia. Pura estupidez! A inteligência pensa que as coisas espirituais são
pura estupidez. Até hoje todo mundo sabe disto. São Paulo diz: o homem
intelectual não compreende as coisas do espírito, até lhe parece estultícia.
Nem as pode compreender porque as coisas espirituais devem ser compreendidas
espiritualmente. Espiritualmente é por intuição. E intelectualmente é por
análise.
Quando nós nos
detemos a analisar coisas espirituais sai sempre bobagem. Nós podemos intuir as
coisas espirituais, mas a intuição não tem linguagem. A intuição é silenciosa.
A gente pode conscientizar a verdade, mas não pode pensar propriamente, porque
pensar é uma análise. Quando a gente pensa uma verdade espiritual já está
deturpada. O nosso pensamento deturpa tudo. Ele é bom para as coisas intelectuais.
Para a física, a química, a biologia nossa inteligência serve. Mas se ela se
mete no terreno espiritual, propriamente, que é intuição, então ele deturpa
tudo. Quando a gente pensa, analisa uma coisa espiritual já está deturpada. E
quando, depois de pensar ainda a gente tem que falar, está duas vezes
deturpada. Porque a fala ainda deturpa mais do que o próprio pensamento.
Nós temos que
verbalizar o pensamento, mas a verbalização é sempre uma deturpação. As coisas
muito elevadas não se podem nem pensar, nem falar, e ainda menos escrever. A
terceira deturpação é quando se escreve. Primeira deturpação é pensar, segunda
é falar e a terceira é escrever. E quando as coisas são três vezes deturpadas
então chega aos nossos olhos. E nós não podemos compreender estas três
deturpações. Pensar, falar e escrever são deturpações do mundo espiritual.
São males
necessários, infelizmente, essas três coisas, para a nossa vida. Mas, devemos
sempre lembrar. Isto não é a verdade. Isto é uma seta no caminho para indicar o
caminho à verdade, mas, não é a verdade. E por isso, tudo que analisamos
mentalmente está sempre deturpado. A teologia foi analisada e por isso chegou
aquela história que desenhei no princípio. A ciência é pura análise e por isso
está deturpada. Isto aqui não é ciência, nem é teologia. Isto é uma espécie de
filosofia intuitiva.
A filosofia
está eqüidistante da teologia e da ciência. Ciência não é filosofia. Teologia
não é filosofia. Mas no meio dos dois, entre a teologia intelectual e a ciência
intelectual está uma filosofia que pode ser intelectual, mas ela devia ser
intuitiva. A filosofia nas faculdades é geralmente puramente intelectual. Mas
há uma filosofia muito intuitiva. E Einstein insiste com a filosofia intuitiva
dele.
Quando ele era
perguntado como é que ele descobriu essas leis da natureza, ele sempre diz: não
descobri nada por análise. Sempre afirma que não descobriu nada por análise. Descobri
por intuição. Usa sempre a palavra intuição. Às vezes, revelação.
Quer dizer, há uma filosofia intuitiva que é
racional. A filosofia analítica é puramente intelectual. Geralmente nas
faculdades a gente não vai até a filosofia intuitiva racional. Mas fica na
rotina horizontal da filosofia analítica intelectual. A verdadeira filosofia
vai até a racionalidade. Não só intelectualidade. Eu já disse, vocês não devem
confundir inteligência com razão. Porque inteligência é o noos e razão é o
Logos. Os gregos já distinguiam muito bem. Noos é inteligência e Logos é razão.
A razão é intuitiva. A inteligência é apenas analítica.
Por isso
quando uma verdade intuitiva é analisada intelectualmente, há sempre o perigo
de ser deturpada. Então vamos entrar nesta intuição, naturalmente uma intuição
não se pode desenhar.
Eu estou
desenhando isto, isto é apenas um símbolo da intuição. Não é uma intuição
verdadeira. Então podemos imaginar que o homem começou aqui no ponto mais baixo
1 e logo no princípio prevaleceu o pólo negativo. Mas, por sugestão da serpente
que é sugestão da inteligência, é sugestão do ego que é sempre inimigo do Eu,
logo veio a serpente e disse: aquilo que Deus vos disse não é verdade.
Podeis desobedecer a Deus, não faz mal. Então veio a inteligência e sugeriu
uma coisa contra o espírito. O sopro de Deus é este aqui. Este é o sibilo da
serpente. Porque o ego é o pior inimigo do Eu. Logo no princípio do Gênesis
está – o ego desmente o que Deus disse para o Eu. O sibilo da serpente é contrário
ao sopro de Deus.
Assim começou
a nossa história. Começou com um negativo, mas não prosseguiu eternamente com
negativo. Porque o livre arbítrio permite a mudança entre negativo e positivo.
Se nós não tivéssemos livre arbítrio, se fôssemos autômatos, então só podíamos
ficar ou no positivo ou no negativo. Mas, se há possibilidade de mudar de um
pólo para o outro, isso se chama livre arbítrio. Nós somos os únicos seres aqui
na terra que possuímos verdadeiramente este dom estranho que nós chamamos o livre
arbítrio. Pode ser imperfeito, mas ele existe.
É um poder
creativo. Nós podemos crear o bem e podemos crear o mal. Podemos passar do mal
para o bem e do bem para o mal. E esta viagem através dos dois pólos opostos e
complementares é a nossa evolução. Nós temos a possibilidade da evolução até o
máximo. Até a imagem e semelhança de Deus, que seria aqui. E quando chegamos
perto disto continuam o positivo e o negativo. Nunca vão ser abolidos porque a
nossa natureza humana é essencialmente imutável na sua constituição. Fica
sempre em homens normais o positivo e o negativo. Eu posso fazer o bem, eu
posso fazer o mal, mas pouco a pouco pode haver um tratado de paz entre os
dois. O tratado de paz não vai partir do ego, como dizem. Paulo de Tarso disse
e a Bhagavad Gita disse e muitos outros disseram. O tratado de paz entre o Eu e
o ego não vai partir do ego. Mas pode partir do Eu, não do ego, porque o ego é
o tolo e o Eu é o sábio. O tolo não compreende o sábio, mas o sábio compreende
muito bem o tolo.
Não é isso
mesmo? O Eu compreende o ego, mas o ego não compreende o Eu; não há compreensão
de baixo para cima. Só há compreensão de cima para baixo. Do Eu para o ego há
compreensão. Do ego para o Eu não há compreensão, sempre hostilidade. Mas como
nosso Eu pode reforçar-se até tal ponto que ele pode dar ordens ao ego e dizer:
vai à minha retaguarda. Não te ponhas na minha vanguarda. Eu vou à vanguarda,
diz o Eu. E tu tomas o teu lugar na
retaguarda. Tu és para servir, não para mandar.
A Bhagavad
Gita diz mais uma vez: o ego é um péssimo senhor da nossa vida, vejam
bem, mas é um ótimo servidor. Outra vez, a mesma coisa. O ego faz
péssima figura na vanguarda, como senhor da nossa vida, mas cumpre
perfeitamente a sua missão de servidor na retaguarda. Nós não podemos abolir o
ego e também não devemos. Nós devemos incorporar o ego no Eu. Devemos integrar
o menor no maior.
Quer dizer, a
fórmula errada é esta aqui. Aqui o Eu está derrotado pelo ego (ego> Eu).
Aqui o Eu está na retaguarda e o ego está na vanguarda. Isto é que se chama
pecado. Este estado de coisa. Aqui está redenção (Eu > ego). Aqui estão as
duas fórmulas de pecado e redenção. Toda teologia há 2000 anos não fala de
outras coisas senão de pecado e redenção. Podeis ver em qualquer teologia –
pecado e redenção. Queda e redenção. Mas, é claro que é. Mas nós provocamos a
queda e redenção. Não há nenhum fator fora de nós que faça a nossa queda. O
nosso pecado. Eu é que faço – sou o autor do meu pecado. E eu que sou autor do
meu pecado. Eu também posso ser isto, meu redentor. Isto é redenção. Quando o
Eu sujeita o ego à suas ordens. Isto é redenção perfeita. Isto é ordem
invertida. Isto é anticósmico. Isto é cósmico. Isto é a ordem verdadeira.
(mostrando Eu > ego e ego > Eu)
Nós temos que
começar a contemplar a iniciação da humanidade e sua evolução através desses
desenhos aí. A geometria é muito boa para explicar essas coisas. Então, repito
que isto aqui é queda e isto aqui é redenção. Aqui o ego derrotando o Eu – é o
pecado. E aqui o Eu sujeitando o ego a seu serviço é a nossa redenção. Eu não
vejo outra coisa senão outro modo de conceber a origem e a evolução da
humanidade senão só isto, através disto. Começou com 1, teve ordem de ir até
100 e talvez além, mas ele tem que fazer esta viagem. Outros não podem fazer por
mim. O Cristo não me pode redimir. Eu me posso redimir. O diabo não me pode
fazer pecador. Eu é que me faço pecador. Nós sempre atribuímos a fatores
externos o que está dentro de nós. Nós somos o Cristo e nós somos também o
anticristo. É claro.
Aqui nós somos
o Cristo. Aqui nós somos o anticristo, mas eles fazem parte da nossa natureza,
os dois. Então, nós somos os autores, responsáveis pela nossa queda e somos os
autores responsáveis pela nossa redenção.
TRANSCRIÇÃO DA AULA 15 - Realismo Puro
Curso Filosofia Univérsica
Um
curso sério de filosofia tem que estar imunizado contra qualquer ideologia
errada que apareça no mundo. Aparecem tantas ideologias ilusórias que muitos
não sabem distinguir. Vamos tratar de algumas dessas ideologias que têm que ver
com o nosso assunto.
No século
passado apareceu nos Estados Unidos - iniciado por uma senhora muito
inteligente, Mary Baker Eddy - um movimento que hoje é um movimento mundial: Christian
Science – Ciência Cristã – também existe no Brasil. A tese fundamental da
ciência cristã da senhora Baker que hoje existe em todos os paises do mundo – é
a seguinte: no mundo de Deus não existem males porque Deus fez o mundo
perfeito e não pode haver males no mundo de Deus. A senhora Baker da
Christian Science se refere aos males físicos, por enquanto. Doenças e morte.
Ela afirma que tais coisas não existem no mundo de Deus porque Deus não creou
coisas negativas. Deus só creou coisas positivas. Tudo é perfeito, é saúde e
vida e paz. Isso foi do século passado (séc. XIX) - e até hoje existe no mundo
inteiro.
Não há doenças. Doenças são ilusões. Não
existe nenhum câncer, câncer é ilusão. Não existe tuberculose - tuberculose é
ilusão. Não existem doenças cardíacas. São todas ilusões. Isso é da Christian
Science. Nós vivemos na ilusão como se existissem males físicos. Não pode
existir um mal físico neste mundo porque o mundo de Deus é perfeito.
Maravilhosa essa tese! Infelizmente não é verdade.
Neste
século apareceu outro grande pensador, Joel Goldsmith – trata do mesmo assunto
em todos os seus livros - se existe ou não existem males físicos no mundo de
Deus. E Joel Goldsmith contou no seu livro, A Arte de Curar pelo Espírito; e em
todos os livros dele, chega à conclusão: existem males físicos no mundo de
Deus. Quer dizer que é uma grande novidade. Ultrapassou a Christian Science
que afirma que não existem males, é pura ilusão. Nós cremos nos males e por
isso os males existem – diz a Christian Science. Mas, Goldsmith vai muito além
disso. Diz: não senhor, os males não são imaginários, os males não são
ilusórios, os males que existem nesse mundo são reais (Christian Science
diz que nada é real no mal, só o bem é real – doença não pode ser real, câncer
não é real, tuberculose não é real, a fratura numa perna não é real, um
desastre não é real).
Agora
Goldsmith vai além disto. Não senhor,
existe tuberculose, existe câncer, existem fraturas, existem doenças de toda
espécie. O mundo está completo de hospitais por causa de doenças físicas e
também de hospícios por causa de doenças mentais. São reais, não são
imaginárias. Goldsmith deu um grande passo para frente.
E agora,
perguntamos, como é que no mundo de Deus podem existir males físicos? Joel
Goldsmith compreende muito bem esta pergunta. Ele disse: no mundo de Deus
existem males físicos, não feitos por Deus, mas feitos por nós. Esta é a
grande diferença entre ele e a Christian Science. Os males físicos são
reais, são verdadeiramente, objetivamente reais, e não são imaginários, mas
Deus não os fez. Nós é que fizemos as doenças. O nosso ego mental é que faz as
doenças. Às vezes não é o ego individual, mas o ego coletivo. A mentalidade
coletiva da humanidade, diz Goldsmith, também é produtora de males.
É uma poluição
mental, vamos dizer. Se alguém entra na cidade de São Paulo, se alguém morre de
poluição - e muitos já morreram de poluição – a culpa não é do morto porque ele
não criou a poluição. Mas ele está vivendo da poluição. Outros criaram a
poluição. As fabricas, os automóveis criaram a poluição. Mas ele
individualmente não é culpado pela poluição de que ele morreu. A mesma coisa se
dá no mundo fora das cidades também. Se o mundo está mentalmente poluído, isto
produz males físicos e não somente males morais. Porque a poluição mental e
emocional também produz efeitos físicos.
Por isso esta
pergunta: como é que uma criança pode nascer doente quando ela não é culpada de
nenhuma aberração física? Não, a criança pode não ser culpada e não é mesmo.
Outros dizem que ela herdou o karma de uma vida passada, mas, não vamos entrar
nesta hipótese. Vamos saber porque é que ela está doente quando ela não cometeu
nenhum mal mental. A humanidade coletiva está 90% poluída mentalmente. É claro
que está!
O mundo é um
mundo de pecadores hoje em dia. Um mundo de mentalmente errados. Pensamentos
errados, pensamentos negativos são realidades que produzem ondulações ou
vibrações físicas. Então Goldsmith diz: os males existem, nem sempre foram
criados pela pessoa que sofre o mal, mas foram criados pela humanidade coletiva
que jaz no maligno, como diz a Bíblia. Jaz no maligno, toda a humanidade. E o
Cristo diz: o príncipe deste mundo que é o poder das trevas (as
trevas são os males) tem poder sobre vós. Afirma que o dominador deste mundo
que é a mentalidade coletiva – nós chamamos isto o diabo – mas Jesus não refere
ao diabo físico, ele se refere à mentalidade coletiva que ele chama o dominador
deste mundo que é o poder das trevas. Tem poder sobre vós, ele diz aos
seus discípulos. Depois ele acrescenta: mas sobre mim ele não tem poder
porque eu já venci este mundo.
Naturalmente
que se alguém se imunizou contra a poluição mental do mundo, é claro que não
lhe pode atingir. O caso de Jesus. Nunca esteve doente, não morreu
compulsoriamente, morreu voluntariamente e depois reviveu. Quer dizer, o poder
deste mundo, o poder negativo, mental que ele chama o príncipe deste mundo que
é poder sobre as trevas, tem poder sobre vós todos – diz aos homens. Sobre mim,
ele diz – eles não têm nenhum poder, porque eu já venci este mundo. Se nós
pudéssemos dizer isto sem mentir, é claro que nós nunca estaríamos doentes.
Também não precisaríamos morrer fisicamente. Podíamos transformar nosso corpo
físico num corpo astral – como alguns fizeram. Como Moisés fez, como Elias fez,
como mesmo em nosso tempo, Babaji fez na Índia e outros – porque já tinham
vencido o mundo.
O mundo - são
as vibrações negativas que vêm sempre do nosso ego mental. E nós não vencemos
ainda. Nós somos ainda alérgicos a essas vibrações negativas da humanidade –
talvez não nossas. Pode ser que alguém não tenha produzido poluição mental. Mas
ele pode ser vítima, se ele não se imunizar. Ele pode imunizar por um poder
superior. Um poder superior ao mental é um poder espiritual. Mas, quem é que é
poderoso no mundo espiritual? Quem? Ás vezes nós tratamos de coisas
espirituais, assim de passagem. Como um divertimento domingueiro, como um “hobby”
qualquer, mas isto não é vencer o mundo das trevas... O mundo mental é sempre
chamado pelos iniciados, o mundo negativo, o mundo das trevas. Treva é um
conceito negativo. Luz é um conceito positivo. Treva é ausência e luz é
presença.
Logo, Joel
Goldsmith afirma que os males físicos existem neste mundo em grande quantidade
– não foram creados por Deus, porque Deus não creou câncer. Deus não creou
tuberculose. Deus não creou nenhum mal físico. Tanto assim que os grandes
iniciados não sofreram de males físicos. Moisés não consta nenhuma doença dele.
E também não morreu. Transformou seu corpo com 120 anos num corpo astral. Jesus
nunca esteve doente. Também não foi derrotado pela morte, mas ele se entregou
voluntariamente. Ele diz claramente: ninguém me pode tirar a vida.
Imagina! Quem é que pode dizer, ninguém me pode matar. Ninguém. Não existe nada
no mundo que me possa matar. Ele diz, ninguém me tira a vida, eu deponho a
minha vida quando eu quero e retomo a minha vida quando eu quero.
Bem, quem fala
assim sem mentira e o realizou, pode dizer: eu venci este mundo. Eu venci
este mundo negativo das doenças e da morte. São coisas negativas. Mas quem
não está na altura da espiritualidade não pode dizer isto. Nós somos todos
principiantes de ABC na espiritualidade. A alguns. Alguns sabem o B, alguns
sabem o C, mas ninguém chegou até o fim. Mas os grandes iniciados podiam dizer
isto, alguns deles, sobretudo o Cristo.
Então
Goldsmith aceita os males, as doenças são realidades e não são imaginação, não
são ilusão. Quem criou essas realidades não foi Deus. Foi o nosso ego. O nosso
ego também é uma espécie de Deus é o demiurgo como diziam os gregos. Os gregos
usavam a palavra demiurgo para o ego. Demi quer dizer semi, metade. Urgo é
obreiro. Semi-obreiro. Demiurgo – semicreador. O nosso ego mental é um demiurgo
– em língua grega. É um semicreador. Ele pode crear algumas coisas, sobretudo
coisas negativas. O nosso ego pode criar doenças, é claro que pode, mas não
pode abolir.
Isto Goldsmith
faz ver muito claramente no seu livro, que o nosso ego é um creador de doenças,
mas não é um abolidor de doenças. E agora estamos num impasse: se o nosso ego
criou doenças e não pode abolir as doenças, (como não pode mesmo) estamos
fritos. Então temos que ficar nas doenças. Pura verdade. É muita lógica. O ego
negativo, a nossa poluição mental, seja individual, ou seja, coletiva da humanidade
produz os males físicos. Aqui não se trata de males morais, por enquanto. Os
males físicos são produtos do nosso ego negativo - do poder das trevas. E não
pode abolir o que ele criou. O mental não pode abolir o mental. A criação
mental não pode ser abolida pelo criador mental. Não pode.
Segue-se
que se nós não invocarmos um poder acima do mental, nós não temos o poder de
criar os males que o ego produziu. É lógica absoluta. Devemos então descobrir
um poder superior ao poder mental porque o poder mental criou os males e nós
precisamos de alguém que possa abolir os males. Mas se nós não descobrirmos
este poder ultramental, supramental, transmental que nós geralmente chamamos
poder espiritual, que reside no nosso Eu central, (não no nosso ego periférico
onde residem as doenças, o poder negativo)... Se nós não descobrirmos o fator
positivo em nós, o poder central da cura, nós não nos podemos curar. Só nos podemos fazer doentes, mas não nos
podemos curar.
Então os
ingênuos pensam que há um Deus lá fora que tem que ser invocado para ele curar
a minha doença. Goldsmith dizia: não adianta invocar um Deus de fora. O que
é importante é evocar o Deus de dentro. Esta é uma das frases mais geniais
de Goldsmith, no seu livro A Arte de Curar pelo Espírito. Não adianta.
Alguém se escandalizou com isso, e disse: mas como é, parece ser ateu?
Diz que não adianta nada rezar, não adianta invocar um Deus se eu estou doente.
Rezo tanto a Deus diariamente e Deus não me cura.
Goldsmith
diz isto não adianta nada. Você não deve pensar num Deus que existe lá do
outro lado da via Láctea, das galáxias do universo. Muito longe e ausente de
você. Logo você não deve pensar nesse Deus... Rezar a esse Deus lá fora... Você
deve descobrir o seu Deus de dentro. Descubra o seu Deus interno, não o Deus
transcendental, mas o Deus imanente. E se você descobrir o Deus imanente que é
a sua própria alma, que é o seu Eu espiritual, então você tem nas mãos um poder
infalível.
Então
você deve evocar, não invocar. Nós sabemos muito bem invocar. Invocamos a Deus,
invocamos à Virgem Maria, invocamos a todos os nossos santos e padroeiros.
Invocamos e invocamos tudo. Nós esquecemos sempre de evocar. Porque todo o
poder está dentro de nós. Todo o poder está dentro de cada um de nós. Eu sou
onipotente no meu centro. Eu sou impotente nas minhas periferias. Nas minhas
periferias eu sou fraqueza. No meu centro eu sou força. E quem disse isso? Foi
o homem mais espiritual deste mundo. O Cristo. O Pai está em vós.
Ele chama o nosso Eu o Pai. O Pai está em mim, primeiro ele diz
de si. Mas o Pai também está em vós, e vós estais no Pai. Sempre
ele fala de um Deus imanente.
Quer
dizer, a cura pelo espírito de que fala Goldsmith sempre é uma coisa
rigorosamente lógica. Não tem nada de misticismo. É uma coisa lógica. Eu sou
fraqueza por fora. Na periferia do meu ego físico, o meu ego mental e do meu
ego emocional. Lá eu sou fraco. Lá eu posso ser vítima de doenças, lá na
periferia - mas se eu encontrar o centro do meu Eu, a minha realidade divina, o
meu Eu central, o meu Cristo interno, o pai em mim e se eu conscientizar: Eu
e o Pai somos um e as obras que eu faço é o Pai em mim que as faz. Isto é
importante acrescentar. São palavras do Cristo. As obras da cura que eu faço,
não é o meu ego que as faz, mas é o Pai em mim – isto é importante acrescentar,
são palavras do Cristo - o meu Eu que as faz. As obras que eu faço – as
obras da cura. As obras que eu faço não é o meu ego que faz, mas é o Pai em
mim, o meu Eu que as faz. Então estaria resolvido todo o nosso problema
físico desse mundo, mas não está resolvido. Por quê? Então Deus não está em
nós? Deus está em nós e em cada creatura. Deus está onipresente. Não está só em
nós. Também está nos animais, inconscientemente. Em nós ele pode estar
conscientemente.
No mundo
inferior, Deus está inconscientemente nos animais, inconscientemente nas
plantas, inconscientemente nas pedras. Não é Deus que é inconsciente. São estes
indivíduos que são inconscientes da presença de Deus. O animal não pode ter a
consciência da presença de Deus. O vegetal não pode ter esta consciência da
presença de Deus. O mineral não pode ter. Nós podemos.
- Professor, pode uma pessoa
encontrar o Deus interno e continuar a ter doenças?
- Não, se encontrou de fato
não vai ter doenças. Você chama encontrar, pensar. Pensar que Deus está em mim.
Não adianta nada pensar que Deus está em mim. Pensar não cura ninguém. E
Goldsmith insiste, você não deve pensar porque pensar é coisa do ego. É uma
função do ego. Você não sai da periferia. Pensando você faz num círculo vicioso
ao redor do seu ego. Isto é pensar. Querer também é um círculo vicioso ao redor
do seu ego. Isto é pensar. Querer também é um círculo vicioso. Dizer, pensar,
querer, tudo isto é periferia. Nada disto é centro.
O que seria centro?
Conscientizar e vivenciar. E Goldsmith insiste nesses dois pontos. Eu devo
conscientizar a presença de Deus em mim. O meu centro é Deus. O meu centro é
saúde. O meu centro é vida. O meu centro é o Pai. O meu centro é o Cristo. Se
eu puder conscientizar... Goldsmith diz: eu levei 13 anos para conseguir uma
conscientização perfeita. Imagina ele - que era um verdadeiro iniciado. Ele
levou 13 anos fazendo exercícios diários de conscientização, e só depois de 13
longos anos de exercícios parcialmente fracassados, ele conseguiu uma
conscientização 100%.
Então ele
diz: se eu conseguir uma conscientização 100% da presença de Deus em mim eu
posso curar qualquer doença, não só minha, mas, também dos outros. Ele
fazia... A qualquer distância. Três vezes ele fez a viagem ao redor do globo
terrestre, a chamado de doentes. Trabalhava gratuitamente. E toda vez que ele
conseguia 100% de consciência da presença de Deus, a doença era infalivelmente
curada. A qualquer distância.
Quando os
doentes lhe telefonavam queriam sempre dar três coisas. Primeiro dizer qual é o
nome do doente. Ele dizia: não senhor, eu não quero saber o nome do doente.
Deus sabe e chega. 2o eles queriam dizer, qual era a doença de
que ele sofre. Ele não aceitava. Não, Deus sabe qual é a doença, não precisa
dizer. 3o – queriam dar o endereço. Não quero saber nome, nem
doença, nem endereço do doente. Deus sabe e chega. Eu só quero conscientizar a
presença de Deus até o máximo. Quem nunca fez não pode imaginar o que seja
conscientizar.
Goldsmith
disse que ele levou 13 anos para conseguir uma conscientização perfeita. Ele -
nós temos de levar um século para conseguir. Se não fizermos exercícios diários
muito intensos, nunca vamos conseguir, e não temos nas mãos nenhum meio para
nos curar. Cada um pode se curar a si mesmo e pode curar os doentes, mas,
somente por uma intensa conscientização da presença de Deus. Não é a presença
de Deus que cura. No doente Deus também está presente. Num tuberculoso, num
canceroso, Deus também está presente. Por que é que não cura? Não é a presença
de Deus que cura alguém. Nunca ninguém foi curado pela presença de Deus. O que
cura é unicamente a consciência da presença e não a presença.
É difícil este ponto.
Naturalmente essa conscientização é impossível sem a correspondente vivência.
Quem não vive por fora o que ele conscientiza por dentro não vai conseguir a
conscientização. E aí que está o erro de muitos. Nós por fora vemos
contrariamente a conscientização de Deus. Quem anda agarrado às coisas
externas, não somente quem usa (podemos usar, mas quem se deixa tiranizar pelas
coisas externas, pela propriedade, pela família, pela sociedade) não está em
condições de conscientizar. Porque isto é escravidão. Quem vive na escravidão
não pode conscientizar Deus, porque Deus é infinita liberdade.
Então, para
conseguir a conscientização nós devíamos em 1o lugar modificar
profundamente a nossa vida diária. Devíamos usufruir o necessário para uma vida
descentemente humana. Não é preciso jogar fora tudo. Não, não podemos viver se
não temos nada. Mas, se nós vivêssemos apenas do necessário e não do
supérfluo... (porque mais de 50% do que nós temos é supérfluo, é claro) nem 50%
são necessários para uma vida decentemente humana. Mas ninguém se convence
disso. Ele precisa que tenha cada vez mais e mais conforto. Apareceu uma coisa
nova é preciso comprar. É evidente que tenho que comprar. Não posso mais viver
sem isso. Quer dizer que nós vivemos numa permanente escravidão.
Quem vive
na escravidão das coisas exteriores, sobretudo família e sociedade não pode
conscientizar devidamente a presença de Deus. É o grande impedimento de quase
todos.
Bem,
isto, quanto aos males físicos de que fala a Christian Science negando os males
físicos e de que fala Goldsmith afirmando os males físicos, mas, não os atribui
a Deus. Esta é a grande diferença entre Goldsmith e a Christian Science. Ele
afirma que os males físicos são reais porque nós os criamos. Pelo nosso ego
mental nós somos responsáveis pelos males físicos. Nossos individualmente ou
nossos coletivamente. Nunca pensar que cada um seja responsável só pelos seus
erros individuais.
Pode ser que alguém não tenha
erros individuais, mas nós também somos vítimas dos erros coletivos da
humanidade. Nós, partes integrantes de um grande organismo humano e cada célula
que é cada indivíduo sofre os males do organismo. Se o organismo está doente é
claro que as células estão doentes. Nós não podemos ter o organismo humano
doentio, como temos - organismo coletivo da humanidade, bilhões de seres
humanos - e manter saúde na nossa célula individual. É muito difícil. De
maneira que enquanto a humanidade não tiver saúde é dificilmente o indivíduo
ter saúde.
Bem, mas
eu não ia falar sobre os males físicos. Eu ia falar hoje sobre os males morais.
Falei muito nos últimos dias sobre bens morais e bens físicos, e males morais e
males físicos. Não vamos dizer, falei muito sobre males morais e bens morais. O
mal moral nós chamamos pecado. O bem moral nós chamamos redenção. Tratamos
muito destes dois termos: pecado e redenção. Toda teologia cristã gira em torno
destas duas palavras. Em qualquer igreja vocês vão ouvir pecado e redenção.
Pecado é um mal moral negativo e redenção é um bem moral positivo.
Bem, nós
afirmamos que há males morais, que há pecados, que ninguém se pode convencer
que não haja pecados. A Bíblia está cheia disto. Do Gênesis até o Apocalipse
sempre se fala em pecado, pecado, pecado. O Evangelho está repleto destas
coisas. Vai-te em paz e não torne a pecar. Jesus supõe que ela pecou –
aquela mulher adúltera. Os seus muitos pecados lhe são perdoados porque
muito amou - da Madalena. É claro que Jesus supõe que há pecado. Portanto,
nós não podemos negar que o pecado seja de uma realidade, não feita por Deus,
mas feita por nós. Outra vez, os males físicos não são feitos por Deus e os males
morais que são os pecados também não são feitos por Deus.
Agora
estamos diante da alternativa - pecado e redenção. Pecado corresponde à doença
e redenção corresponde à saúde - num outro terreno. No mundo físico o negativo
é a doença e o positivo é a saúde. E no mundo moral o negativo é o pecado e o
positivo é o que a Bíblia chama a justiça. Quando a Bíblia fala justiça nós não
devemos pensar em justiça social. Nós falamos muito em justiça social. Não, a
Bíblia não entende por justiça, justiça social. Ela entende justiça o
verdadeiro e correto ajustamento entre nós e Deus. Isto é justiça na Bíblia. A
justeza - vamos dizer. O correto ajustamento entre o homem e Deus. Quando ele
está bem ajustado com Deus então ele é justo. Quando ele está mal ajustado então
ele é pecador. Pecador é o não ajustamento entre o homem e Deus, e justiça na
Bíblia é um correto ajustamento com Deus. Uma harmonia é um ajustamento. Uma desarmonia é um desajustamento.
Quando
estamos sintonizados com Deus, quando a nossa consciência está em sintonia com
a consciência divina, então nós somos justos. Somos ajustados corretamente e
então nós somos santos. Santidade, justiça e redenção, tudo isto é a mesma
coisa. Bem, de maneira que afirmamos que como há males físicos feitos por nós,
assim também há males morais feitos por nós, porque Deus não fez males físicos,
Deus também não fez males morais. Os males morais foram por nossa conta e os
males físicos são conseqüência dos nossos males morais. Há uma rigorosa
concatenação entre males morais e males físicos.
A humanidade toda está na
maldade moral. 99% pelo menos. Os crimes que acontecem - não aqueles que os
jornais trazem na 1a página, isto não é 1% dos crimes que acontecem
nas 24 horas, quando os jornais saem. Os jornais gostam de contar os crimes
tais e tais, fulano matou sicrano, roubou isto – bem isto não representa 1% da
maldade humana. A maior parte não é conhecida dos jornais.
Quer dizer, a humanidade jaz no
maligno, diz a Bíblia e o príncipe deste mundo que é o poder das trevas tem
poder sobre a humanidade, porque nós lhe entregamos o poder. Nós lhe entregamos
o poder e por isso a maldade tem poder sobre nós. E daí depois vêm os males
físicos. Os males físicos são conseqüências dos males morais.
Bem, aparece, porém, alguém e
diz, não existe nenhum pecado. Não existe nenhum mal moral. Eu tenho meia dúzia
de livros lá em casa que afirma isto. Todos do mesmo autor. O último é esse
aqui: Masaharu Taniguchi – fundador da Seicho-no-ie – que tem milhares de
adeptos no Brasil e fora do Brasil. Chegando a tratar do pecado ele diz: Pura
invenção, não existe nenhum pecado. Nunca existiu pecado e não existe nenhum
pecado. É muito bonito. Otimismo formidável. Infelizmente não é verdade.
Como é que não existe nenhum pecado e nunca existiu? Do princípio até o fim ele
afirma isso. Ele é um ótimo psicólogo. Um péssimo filósofo. Na psicologia ele é
muito forte. Muito bem! Na filosofia é zero virgula zero. Como é que diz que
não existe nenhum mal moral no mundo?
Então aqueles crimes
ultimamente cometidos na Itália com o presidente Aldo Moro, torturando o homem
barbaramente, e depois matando, não era mal moral? Não era pecado? O que fez a
última guerra matando 100 milhões de inocentes, não era crime, não era pecado?
E o que acontece aqui entre nós a cada momento. De 30 em 30 minutos - diz a
estatística de São Paulo – acontece um crime em São Paulo. E nos Estados Unidos
é de 10 em 10 minutos. E dizer que não existe pecado, que não existe mal. É uma
leviandade tão grande que a gente não sabe como um homem sério como Taniguchi
pode afirmar coisas tão absurdas. E milhares de pessoas acreditam.
Ah! Que grande profeta este lá
do Japão. Descobriu que pecado é pura ilusão, é pura imaginação que eu tenho
pecado. Eu não tenho nenhum pecado, meu amigo não tem nenhum pecado, nunca
ninguém teve nenhum pecado. Somos
todos santos. Canonização universal. E qual é a prova que Taniguchi traz
que não há pecado no mundo? A prova é a seguinte, escutem bem o fracasso da
filosofia dele: Deus fez o mundo perfeito e o pecado seria uma coisa
imperfeita, logo não existe pecado. Pronto.
O que é que vocês me respondem
a isto? Este silogismo está certo ou não? Este silogismo de Taniguchi... Ele
diz Deus fez o mundo perfeito. Não fez uma mistura de perfeição e imperfeição,
isto Deus não fez. Deus é o sumo bem e Deus fez somente o bem e não fez o mal,
mas o pecado é um mal, logo não existe pecado. É o argumento dele. E muitos que
não têm critérios suficientes, embora tenham boa vontade, dizem: mas, ele tem
razão. Onde é que nós inventamos esta bobagem de pecado. Não seria melhor
acabar com isto de uma vez? Pura ilusão dos teólogos que inventaram que há tal
coisa como pecado. Não existe pecado. Vão viver em paz e felicidade e dizer:
não há pecado, não há pecado e pronto.
Isto é política de avestruz.
Vocês sabem que dizem que a avestruz no deserto lá na África, aquela ave grande
que não voa, mas corre muito; quando ela é perseguida (dizem, não sei se é
verdade, mas todo o mundo chama isto política de avestruz) dizem que a avestruz
quando é perseguida pelo caçador, ela corre como um cavalo. Então ela não pode
fugir mais no fim, pára e esconde a cabeça debaixo da areia. E porque ela não
enxerga mais o caçador, ela pensa que o caçador não existe mais. Dizem que a
avestruz tem essa filosofia: Eu não vejo o caçador, porque está com a cabeça
debaixo da areia, então o caçador não existe mais. Depois o caçador mata.
Isto que o Taniguchi está
fazendo é política de avestruz. Eu não quero ver que haja pecado no mundo,
então não há mesmo. Pronto. Política de avestruz. Então eu digo
simplesmente, não existe. Veja uma coisa parecida com aquilo da Christian
Science quanto às doenças. A Christian Science diz, não há doença, então não há
– mas, contudo há. E Taniguchi diz: não há pecado – então não há, mas, contudo
há. O mundo está cheio e a Bíblia está repleta de menções de pecados.
Então vamos ver o argumento.
Ele diz que Deus fez o mundo 100% bom. E não pode haver pecado num mundo 100%
bom. É um silogismo 100% errado. Deus nada tem que ver com o pecado. Que Deus
creou creaturas dotadas de livre arbítrio. E onde há livre arbítrio há duas
possibilidades. Há a possibilidade para o bem e há a possibilidade para o mal.
O bem é o positivo. No mundo físico o bem é a saúde. E no mundo moral o bem é a
santidade ou a justiça. Mas, Deus não creou o uso do livre arbítrio. O uso e o
abuso do livre arbítrio não correm por conta de Deus. Isso corre por nossa
conta exclusiva. Deus creou a faculdade dentro de cada um de nós. A faculdade
do livre arbítrio. Eu te ponho aqui na terra. Tu podes fazer o bem e podes
fazer o mal – diz Deus, mas eu não sou responsável pelo bem que tu fizeres,
também não sou responsável pelo mal que tu fizeres. Isto está certo.
Mas, Taniguchi acha, se Deus creou o
homem então o homem só pode fazer o bem, mas não pode fazer o mal. Onde está o
livro arbítrio? Então não existiria uma pessoa humana no mundo. Se existe um
homem que necessariamente tem que fazer o bem e não pode fazer o mal, ele não
tem liberdade. O bem que ele faz não corre por conta dele. Corre por conta de
Deus. Mas se ele pode fazer o bem e o mal por conta própria então é claro, se
existe o bem necessariamente deve poder existir o mal. Não pode haver uma
creatura dotada de livre arbítrio que tenha só uma possibilidade diante de si –
uma linha reta, assim._____________ O animal só tem uma linha reta. Assim seria uma creatura não humana. Uma
única possibilidade. Não pode fazer o bem nem o mal. O animal é neutro. Não é
moralmente bom e não é moralmente mau. O animal é simplesmente neutro. O neutro
é representado por esse sinal aqui. ── Agora começa o homem aqui. Começa a
linha bifurcada. ─┴─
Uma linha positiva ( ) e uma linha
negativa (-). Aqui começa o livre arbítrio.
Deus não é responsável por esse positivo e não é responsável por esse
negativo (±). Deus é responsável por essa faculdade, essa bipolaridade, essa
possibilidade do livre arbítrio; a faculdade do livre arbítrio sim é obra de
Deus, mas o modo como o homem emprega essa faculdade do livre arbítrio nada tem
que ver com Deus.
Deus não fez isto que o homem
faz, a justiça. E Deus não fez isto que o homem faz, o pecado. Isto vem por
conta exclusiva do homem. Portanto, esse argumento de Taniguchi, se Deus fez o
mundo perfeito então não pode haver pecado, isto é radicalmente errado. Fora de
toda a lógica, porque perfeito não quer dizer que todo ser deva necessariamente
fazer o bem. O animal aqui não pode fazer o bem nem o mal, mas é perfeito, a
seu modo - porque é neutro. Aqui há neutralidade. Ele não pode ser moralmente
mal, o animal. E também não pode ser
moralmente bom. Ele é bom como diz o texto do Gênesis, mas quando Deus creou o
homem ele é muito bom. Deus fez o homem que era uma obra muito boa. Quer dizer,
começa o livre arbítrio e começa a humanidade. O dom do livre arbítrio é uma
coisa muito boa. Aqui começa uma coisa muito melhor do que aqui. O animal não
tem livre arbítrio. O animal é um autômato vivo. Nós não somos autômatos. Nós
podemos tomar nas mãos o nosso destino e dizer: eu tenho a possibilidade de
fazer o bem, eu tenho a possibilidade de fazer o mal. Isto é uma grande
vantagem sobre o animal. O animal é neutro. É uma máquina.
Então aqui começa uma creatura
muito superior ao animal. Porque é uma creatura creadora e o animal é apenas
uma creatura creada. No animal não há nenhuma creatividade. No homem há creatividade.
O animal está na creaturidade e o homem está na creatividade. Se usarmos esses
termos que inventei. A creaturidade é do animal e das plantas e dos minerais.
Tudo neutro. Mas a creatividade seja positiva seja negativa é do homem. É uma
grande perfeição poder ser creativo e não apenas creado. O animal é creado, mas
não é creador. Ele não se pode fazer melhor e pior do que é. Geralmente, não.
Deus creou o homem o menos
possível para que o homem se possa crear o mais possível. É uma grande
perfeição. Mas dizer que porque Deus fez uma obra perfeita - que é o livre
arbítrio - nós podemos aperfeiçoar cada vez mais o nosso livre arbítrio, mas a
raiz já vem desde o nascimento. Desde o nascimento já está em nós a raiz do
livre arbítrio que depois podemos aperfeiçoar. Mas, dizer, não pode haver o
negativo, o pecado... - porque o negativo não é perfeito - também devemos dizer
que não há também positivo. O positivo não depende de Deus. Nenhum dos dois
depende de Deus. O positivo da justiça não depende de Deus. É da minha boa
vontade. E o negativo do pecado também não depende de Deus. É completamente
independente. Deus não tem jurisdição
aqui. Deus tem plena jurisdição aqui. O animal faz exatamente aquilo que a
inteligência cósmica manda fazer. Mas a partir daqui acaba a jurisdição de
Deus. Onde começa a minha consciência do livre arbítrio eu sou o único
responsável pelo bem que eu faço. Deus não é responsável pelo bem que eu faço.
Mas eu também sou o único responsável pelo mal que eu faço.
Por isso esse argumento que se
o mundo é perfeito não pode haver pecado é completamente fora de qualquer
lógica. E por isso nenhum dos livros sacros, nem o judaísmo, nem do
cristianismo, nem do paganismo aceita isso. Vocês não encontram isto nem na
Bhagavad Gita, nem no Tao Te King que são livros do paganismo. Não encontram no
judaísmo que é o Antigo Testamento na Bíblia. Não encontram no cristianismo que
é o Novo Testamento da Bíblia. Não encontram em toda parte: no judaísmo, no
cristianismo, no paganismo se afirma que há uma diferença essencial entre o bem
e o mal. Existe no mundo tanto o bem como o mal, e ambos são atribuídos ao
homem.
O dom de poder fazer poder
fazer o bem e o mal, a faculdade do livre arbítrio é um dom de Deus. Mas o uso
ou o abuso desta faculdade nada tem que ver com Deus. Deus é inocente pelo mal
que eu faço e também pelo bem que eu faço. Deus não faz o bem em mim, eu é que
faço pelo meu livre arbítrio. Deus também não faz o mal em mim. Eu o faço pelo
meu livre arbítrio. De maneira que segundo a convicção universal e segundo a
própria lógica o mal existe, tanto o mal físico como também o mal moral. E o
mal moral é da humanidade porque – o mal físico também podia existir fora do
mal moral - mas o mal moral só é creação da humanidade. Deus nada tem que ver
com a minha criação positiva ou a minha criação negativa.
Por isso num curso de filosofia
nós temos que criar um critério seguro para saber o que é que podemos aceitar
quando aparecem estas ideologias espalham por todo o mundo e todo mundo diz:
Ah! Descobri uma grande coisa. Não há pecado. Aleluia! Hosana Aleluia! Bonito se fosse assim. Seria um otimismo
muito barato. Mas não é realismo. Eu não quero ser otimista nem pessimista. Eu
quero ser realista. Eu quero estar de acordo com a realidade. Realismo puro. Não
otimismo exagerado por um lado, nem pessimismo por outro lado. São dois
extremos: otimismo – é otimista o Taniguchi. E diz: eu vou absolvê-los de todos
os pecados. Daqui por diante não tem mais pode pecar. Ninguém mais pode pecar,
é proibido.
Mas nós devemos ter a certeza
de que tudo é possível. Onde existe o livre arbítrio as duas coisas são
possíveis e Deus quis que fossem possíveis. Deus quis que as duas coisas fossem
possíveis. Porque uma creatura com livre arbítrio é infinitamente mais perfeita
do que uma creatura que não tem livre arbítrio. Nós somos uma nova fase da
creação porque temos nas mãos o nosso destino. Como nós vamos usar o destino,
isto nada tem que ver com Deus. Nós temos que nos decidir se vamos usar o nosso
livre arbítrio para o bem ou para o mal, a faculdade dada por Deus. O uso dessa
faculdade depende de cada um.